Há pelo menos meio século, a sociedade planetária passou a entender de forma mais técnica a destruição do meio ambiente protagonizada pela própria espécie humana. O primeiro relatório sobre o tema da ONU é de 1968. A primeira reunião em nível mundial, em Estocolmo, ocorreu em 1972. De lá para cá, inúmeros outros estudos foram desenvolvidos, assim como Conferências e Tratados. Em comum, o objetivo de tornar a humanidade mais sustentável. O que não vem sendo uma tarefa fácil.
Atualmente, o setor de energia é responsável por cerca de 75% das emissões de gases de efeito estufa (GEE) no mundo, segundo a Agência Internacional de Energia (AIE), porém, no Brasil, essa fatia é de apenas 18%, de acordo com o Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (SEEG). Mesmo assim, o País é o quinto maior emissor global de gases de efeito estufa. O que mais pesa na conta brasileira atualmente é o desmatamento.
Em 2021, o Brasil assumiu o topo do ranking de países que liderou a perda de florestas tropicais no mundo, com 1,5 milhão de hectares de matas primárias derrubadas, o que representa 40% da derrubada total registrada pela plataforma Global Forest Watch (GFW). Na Mata Atlântica, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) registrou alta recorde de 66% no desmatamento em 2021 em relação ao ano anterior, somando 21.642 hectares de florestas derrubados, a maior taxa em 15 anos.
Apesar de haver um sentimento geral de que a descarbonização das cadeias de produção é algo inevitável, esse é um processo que na prática apenas engatinha, segundo especialistas no tema. “Infelizmente, o Brasil andou para trás. Em 2012, nós tínhamos um nível de emissões de 1,2 gigatoneladas de carbono equivalente. Nosso objetivo, segundo a meta inscrita pelo Brasil no Acordo de Paris, era de chegar a 2025 com no máximo 1,3 gigatoneladas e, em 2030, com esse patamar de 1,2 gigatoneladas”, afirma Natalie Unterstell, presidente do Instituto Talanoa. No entanto, o caminho percorrido foi bem diferente. “No ano passado, nossas emissões bateram os 2,42 gigatoneladas. Ou seja, estamos totalmente fora da rota. No atual ritmo de crescimento de emissões não vamos alcançar o net zero nunca.”
Para Natalie, é possível zerar o índice de desmatamento até 2030 – meta estipulada no Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) – “O Brasil já chegou a 80% de redução de emissões oriundas do desmatamento na Amazônia entre 2005 e 2012. Nós sabemos que é possível, porque já foi feito algo muito próximo disso. O contexto agora é diferente, mais complexo por conta dos desafios de insegurança pública na região, assim como a necessidade de reconstituir as instituições e o orçamento públicos.”
Suzana Kahn, vice-diretora da Coppe/UFRJ, salienta alguns pontos positivos, mas que ainda precisam de mais estímulos. “O Brasil reduziu bastante o desmatamento em um determinado período, mas não manteve suas políticas ambientais e voltou a situação de aumento das emissões. Por outro lado, vimos um crescimento significativo de outras fontes renováveis, como a energia eólica”, explica uma das principais especialistas em clima e energia do Brasil.
Além do desmatamento, e apesar do uso em grande escala de fontes renováveis, muitas cadeias de produção no Brasil ainda estão alicerçadas na energia suja, ou seja, a base de combustíveis fósseis. “Ainda estamos nos estágios ‘infantis’ do enfrentamento da crise climática, ao mesmo tempo que a crise já está instalada, sem possibilidade de retorno. As mudanças do clima já manifestadas, como aumento da frequência e intensidade de eventos atmosféricos extremos, alteração nos padrões de precipitações e perda de cobertura dos glaciares não desaparecerão. Trata-se de impedir que piorem para as condições de vida humana”, afirma Roberto Kishinami, coordenador sênior do Portfólio de Energia do Instituto Clima e Sociedade (iCS).
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