Fundador do Movimento Volta Pinheiros, o publicitário e ativista Marcelo Reis cobra do governo estadual transparência e um cronograma "mês a mês" da despoluição do Rio Pinheiros até 2022. Ele acredita no sucesso do plano, apresentado pela gestão João Doria (PSDB), que promete investimento de R$ 1,5 bilhão, a ser pago de acordo com o desempenho de empresas na limpeza do curso d´água.
O Volta Pinheiros funciona como uma espécie de “guerrilha midiática”, segundo Reis, ao chamar a atenção para o esgoto jogado no Pinheiros por meio de ações de marketing. Eles já colocaram bonecos infláveis de cocô no rio e uma cápsula do tempo, com cartas de crianças para o ano de 2020, no Parque do Povo, zona sul de São Paulo. Caso o plano de despoluição dê certo, Reis acredita que o movimento deve se tornar “vigilante” e participar do esforço de manutenção da orla.
“Precisamos ter certeza que esse projeto não é só um passo eleitoral do governo. Esse projeto é para a cidade”, afirma Reis.
O que o senhor achou do plano de R$ 1,5 bilhão para despoluir o Rio Pinheiros, divulgado pela Sabesp?
Conversando com vários atores, que entendem profundamente sobre esse tema, percebemos que tem o sonho de um projeto realmente plausível ali. A própria Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo) já veio até nós para apresentar, pedindo apoio, para conscientizar as pessoas. E a gente tem sempre a mesma opinião, muito transparente com a Sabesp: façam deste um projeto aberto, coletivo, para que as pessoas possam consultar e acessar.
A gente questionou bastante o desassoreamento, que por si só não leva a lugar nenhum e já foi feito. Mas o plano de investimento de R$ 1,5 bilhão tem todo o sentido, do ponto de vista do saneamento. É tudo o que a gente vem estudando com relação à limpeza: a descentralização, os parceiros serem cobrados por performance e não por volume de esgoto coletado, ter mini-estações que cubram os 14 córregos que deságuam no rio, fazer a limpeza para que o destino final não receba a poluição crua e nua. O projeto faz sentido, é plausível.
O que está faltando agora, e que o governo precisa apresentar para que isso não pareça campanha política é: cadê o projeto? Com data, com cronograma, com as empresas?
Abram o projeto para as pessoas, coloquem “deadlines” (prazos), como acontece em qualquer grande empresa de infraestrutura quando apresentar qualquer projeto. Somos acionistas do governo do Estado. A gente quer saber quando começa e termina, como estará em 2021, qual é o passo a passo.
Por que é importante abrir o projeto dessa forma? O que pode ser feito a partir do momento que o governo divulga esse cronograma?
Transparência é colocar os atores civis, ONGs, SOS Mata Atlântica, a USP (Universidade de São Paulo), as empresas de saneamento privado, todo mundo da mesa para discutir o projeto. Isso não pode ser resolvido pelo político e pelo consórcio que vai ganhar dinheiro em cima do saneamento.
É colocar os atores sociais ao lado do governo, participando, discutindo, entendendo, ouvindo. Se não puder abrir para todo mundo participar, tem de ao menos ouvir algumas pessoas idôneas, para a sociedade saber o que está acontecendo.
Outra coisa: transparência é contar para onde vão esse R$ 1,5 bilhão (da despoluição), e os R$ 70 milhões do desassoreamento. Como será usado o nosso dinheiro? A gente precisa saber.
O governo pode não conseguir fazer o que se propõe até 2022. Se as pessoas virem que o projeto está andando e virem seriedade, o governador pode até ter outros interesses políticos, querer virar presidente, mas vamos perceber que há um projeto sério e dar continuidade. Não é um projeto de governo, é de Estado.
O Brasil nunca fez isso. O governo do Estado e a Sabesp têm uma oportunidade de ouro, de transformar um problema em sonho. Eles têm na mão o desejo de 20 milhões de pessoas, que pode se transformar em um exemplo para o Brasil. É um projeto de cidadania, de como reconstruir a credibilidade do povo brasileiro com a classe política. Perto de problemas como saúde, educação e segurança, parece que o rio é bobagem. Mas não é. A questão do saneamento tem (relação) com doenças, qualidade de vida, lazer, economia, emprego formal e informal. Esse governo tem na mão um projeto histórico, e é para fazer disso um legado para o País. Este rio não é um problema, é uma solução. Quem colocar esse projeto à frente será lembrado eternamente por essa cidade.
Qual é o papel da sociedade civil para que a despoluição tenha sucesso? O empresariado da cidade deveria ter alguma responsabilidade nesse esforço?
Sem a participação da população, isso não vai acontecer. Para engajar as pessoas, perceber que empresas idôneas – que não têm a ver com a política – participam é uma demonstração de que o projeto ganhou força. É vital que o governo apresente um projeto detalhado, de longo prazo, mês a mês, semestre a semestre, para que consiga colocar para dentro a credibilidade de CEOs de grandes marcas. Só assim as pessoas vão acreditar que ali existe um projeto.
O que discutimos não é se é viável ou não. É viável, sim. Não tem uma pessoa de empresa de saneamento que não fale: em quatro anos, o rio para de feder e volta a ter aspecto “convivível”.
O que está sendo discutido agora é credibilidade política. Precisamos ter certeza que esse projeto não é só um passo eleitoral do governo. Esse projeto é para a cidade.
Infelizmente, hoje o político está tendo de provar que não usa a coisa pública para interesses partidários. Transparência é o primeiro passo para ter credibilidade. Aí sim vamos conseguir cobrar que alguém não jogue bituca na rua, não jogue plástico na rua, não jogue óleo na pia. Se os pais não cuidam da casa, é impossível cobrar o filho.
E se esse plano fracassar e a sociedade não se mobilizar?
É impossível ter um projeto sério que não visa a mobilização das pessoas. Isso envolve vários políticos. Se você torce contra determinado governador, não vai torcer contra a sua cidade. Não acredito que um projeto desse, feito com seriedade, não ganhe o abraço das pessoas. Como foi a faixa de bicicleta, a faixa de ônibus há muitos anos atrás, como foi a (Lei) Cidade Limpa. É impossível não abraçar.
(A sociedade) Não vai abraçar só se chegar em 2021 e não vermos nada acontecendo. Não há a menor possibilidade de isso acontecer se o projeto for transparente.
No melhor cenário possível, e se o projeto der certo e o governo alcançar as metas? O que acontece com o Movimento Volta Pinheiros quando o rio voltar?
O movimento terá de ser vigilante, e espero que tenha importância e credibilidade. Por isso, precisamos ter muito cuidado agora e saber qual é o projeto. Daqui a algum tempo, vamos ter de deixar de ser “guerrilha midiática” e se transformar em um movimento vigilante.
Uma vez que o rio estiver limpo, podemos começar a convidar marcas para participar da manutenção: restauração de ciclovia, implantar transporte público, quem vai colocar o primeiro restaurante. O movimento pode se desenvolver de diversas formas, sempre convidando as pessoas a ocupar. Quando as pessoas ocupam, não tem mais como deixar degradar.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.