Moradores de Ribeirão Preto, interior de São Paulo, viveram momentos de tensão neste sábado, 24, com os incêndios florestais que se espalham pela região. O prefeito Duarte Nogueira (PSDB) classificou a situação como “fora do comum”, mas afirmou que os planos de contingência elaborados em anos anteriores, justamente para o enfrentamento de episódios de seca e queimadas, ajudaram a cidade a mitigar os efeitos do fogo que chegaram com intensidade ao município.
“Foi totalmente fora do comum. Foi a maior quantidade de incêndio em 20 anos de série histórica”, disse Nogueira, em entrevista ao Estadão. “A gente já vinha enfrentando situações de recrudescimento de seca nos anos anteriores e, há dois anos, implantamos um plano de contingência com os residenciais da cidade. Isso ajudou a mitigar problemas que poderiam ser maiores na ocorrência do dia de hoje”, disse.
Ribeirão Preto teve 14 focos de incêndio espalhados pela cidade, alguns bem próximos de residências como as localizadas no condomínio Alphaville, no distrito Bonfim Paulista. Há relatos de pessoas que tiveram que sair de casa em razão das proximidades das chamas.
O prefeito afirmou que os 14 pontos de incêndios “estão controlados”, inclusive o que atingiu o Alphaville. Disse também que nenhuma pessoa está desabrigada, e que moradores já voltaram para casa. “Esse focos foram controlados. Tivemos um jardim com coqueiro queimado, mas a residência ficou preservada. Mas todas as pessoas já estão em suas casas e não tivemos problema de desabrigados.”
Além do susto de ter a casa tomada pela chamas, há moradores afetados por falta de água e energia elétrica na cidade. Duarte explicou que, dos 120 poços artesianos que abastecem a cidade, 36 foram desligados na sexta-feira por conta da tensão elétrica da distribuidora, mas já foram reativados.
“Hoje (sábado) tivemos mais 26 postos desligados porque tivemos interrupção de energia por conta de ventos de mais de 70 km/h; 17 ainda estão sendo religados”, afirmou o prefeito.
Além do fornecimento de energia, os incêndios também afetam a rede municipal de saúde de Ribeirão Preto. De acordo com a prefeitura, o serviço está com sobrecarga de 60% da demanda de pronto-atendimento a pacientes com problemas respiratórios e de desidratação.
Duarte Nogueira diz que precisou colocar de plantão em hora extra equipes de enfermagem e auxiliar de enfermagem. “Mais que demanda de médicos, a gente tem demanda de procedimentos como inalação, oferta de soro fisiológico, medicamentos de reposição de resultados de desidratação”. Ele garantiu que todos os postos de saúde estão em alerta e funcionando.
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Outra medida adota pela sua gestão foi suspender atividades físicas e esportivas ao livre no final de semana. A decisão afetou partidas de clubes profissionais de futebol, como o Comercial e Botafogo-SP, e suspendeu uma maratona internacional sediada na cidade, e que estava programada.
Ele não sabe se vai ampliar a suspensão dessas atividades ou se manterá apenas até o domingo, como previsto. “Amanhã (domingo), por força da meteorologia, a gente espera que possa ter chuva por volta das hora do almoço. Segundo as informações que temos da nossa equipe de meteorologia, há chance de ter 35% de chuva na hora do almoço”, disse. “Mas só amanhã vamos avaliar se a suspensão das atividades ao ar livre vão ser estendidas ou não.”
Sobre a origem dos incêndios, afirma que podem acontecer desde bitucas de cigarro jogadas em rodovias até o aumento da intensidade de luz solar que, ao passarem de forma translúcida por vidros, acabam dando origem às chamas.
Nogueira afirma, porém, que incêndios criminosos já foram detectados. “O fogo pode começar também por pessoas inescrupulosas. Tem imagens de concessionárias que mostram pessoas, de forma deliberada e criminosa, colocando fogo em mato seco em algumas regiões da nossa cidade. A gente está colocando a polícia em cima delas.”
‘Filme de terror’, relatam moradores
Para a influencer Mariana Pires, de 24 anos, o que ela viu e viveu neste sábado foi como um “filme de terror”. Ela é moradora de um condomínio residencial em Ribeirão Preto que teve que ser evacuado temporariamente por conta da proximidade das chamas. Em 2017, outro ano de muitos incêndios, a influencer lembra que quase chegou a perder a casa por conta de uma forte queimada que atingia uma área verde do outro lado do muro de sua residência.
Dessa vez, disse Mariana ao Estadão, a situação foi muito mais preocupante. Ela conta que uma nuvem preta, densa, que cobriu Ribeirão Preto, fez a cidade “anoitecer às 17h30″. “Por volta das 17h, estava um tempo de neblina, de queimada. De repente, umas 17h30, eu estava me preparando para sair, quando, de repente, um breu, uma nuvem preta que chegou do nada, como se fosse um filme de terror, vindo em direção ao Alphaville (condomínio residencial onde mora)”.
Nesse momento, ela estava a caminho de casa, vindo de um hospital. “Quando cheguei no condomínio, eu entrei em desespero porque eu nunca tinha visto isso. Já tiveram alguns incêndios algumas outras vezes antes. A gente já esperava, mas não imaginava algo tão forte”, diz.
Segundo Mariana, nenhuma casa foi atingida diretamente pelo fogo, mas os moradores receberam a recomendação de evacuarem por conta da fumaça. “Vieram caminhão-pipa, polícia, bombeiro e até moradores ajudaram a controlar esse fogo para que não entrasse no condomínio”.
O que mais assusta, diz Mariana, é que não é o primeiro incêndio. Ela, inclusive, já viveu o risco de ter a casa quase tomada pelas chamas em 2017, ano de muitas queimadas em Ribeirão Preto.
“Todo ano acontece isso. Esse ano foi muito grande e a gente está muito preocupado porque o que eu soube é que esse incêndio não veio de perto, veio de muito longe. Só que o vento está muito forte. E o que o bombeiro nos falou é que e o fogo estava piorando por conta deste vento.”
“O mais tenso é escutar barulho da árvore queimando. Faz um estralo muito forte e às vezes a gente até escuta animais gritando de madrugada. Às vezes eles não conseguem nem fugir”, lamenta a influencer. “Amanhã (domingo) vai estar assustador”.
Moradora da cidade, a jornalista Beatriz Borghini, de 24 anos, conta desde quinta-feira sente dificuldade para respirar em razão da baixa umidade do ar e do cheiro de queimado forte que chega até sua casa. Nascida e vivida em Ribeirão Preto por muitos anos, ela diz que é comum ter estiagens em agosto, mas afirma que o que está sendo presenciado este ano é algo “atípico” e diferente das temporadas anteriores.
“Normalmente, eram alguns pontos de incêndios que eram registrados. Mas, desta vez, são vários (a prefeitura informa que são 14 focos). E eu tenho família que é de Jardinópolis (30 minutos de Ribeirão Preto), e o que nós sabemos é que as estradas de lá estão bloqueadas, as pessoas estão isoladas, não estão conseguindo sair”, diz à reportagem.
A jornalista diz que não tem sido muito afetada pelos incêndios como outros moradores da cidade, e afirma que está em segurança. Relatou que sua casa teve quedas de energias durante o sábado e que o elevador do prédio ficou sem funcionar por alguns períodos.
“Nós estamos em segurança em casa, mas já ouvimos que tem pessoas sem água também. (Os incêndios) É algo esperado para quem é daqui em Ribeirão, a gente sempre presencia essa seca nessa época, mas as proporções que tomaram este ano foi realmente assustador”, diz.
Pelas redes sociais, os moradores também relataram um cenário marcado por céu encoberto por fumaça e a aproximação do fogo em propriedades, o que levou medo à vizinhança. “De acordo com os registros mais recentes, os principais pontos de atenção incluem incêndios em terrenos urbanos e áreas de mata, com destaque para os focos registrados na Rua Leda Vassimon, no Jardim Nova Aliança, e na Mata do Ribeirão Verde, onde as equipes já estão atuando para extinguir o fogo”, informou a gestão municipal.
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