Garimpo cresce em unidades protegidas e ocupa área maior que mineração industrial no País

Levantamento foi divulgado pelo MapBiomas, iniciativa que envolve universidades, ONGs e empresas de tecnologia; aumento de atividade ilegal na Amazônia preocupa

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SÃO PAULO - A área de mineração no Brasil cresceu 564% entre 1985 e 2020, saltando de 31 mil hectares para 206 mil. Boa parte desse crescimento está relacionado ao garimpo, que já ocupa área maior que a mineração industrial e avança por unidades de proteção. Os dados, que resultam da análise de imagens de satélite com o auxílio de inteligência artificial, foram divulgados pelo MapBiomas, iniciativa que envolve universidades, ONGs e empresas de tecnologia.

A expansão do garimpo se deu, principalmente, nos últimos dez anos. Entre 1995 e 2009, a atividade avançava, em média, em 1,5 mil hectares de área por ano. De 2010 a 2020, a expansão anual ficou na média de 6,5 mil hectares, passando de 38,4 mil hectares em 2010 para 107,8 mil em 2020. Os dados mais recentes mostram que 43% da área de mineração é ocupada por indústrias, enquanto 57% abriga garimpeiros.

Graimpo pode causar impacto em cursos d'água Foto: REUTERS/Nacho Doce

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Garimpo é uma forma de mineração mais artesanal, individual e sem maquinário sofisticado. Geralmente é feito sem grandes planejamentos, focando no lucro imediato e não na exploração da mina em longo prazo, ao contrário da mineração industrial. A atividade é legalizada no Brasil, mas o garimpeiro precisa obter autorização do governo para exercê-la.

Os dados compilados pelo MapBiomas mostram que, nos últimos anos, o garimpo ilegal cresceu muito no País. No ano passado, pelo menos metade das áreas de garimpo estavam fora da lei. Além da falta de permissão do governo federal, outro fator que coloca o garimpeiro na ilegalidade é a exploração em locais proibidos como terras indígenas e unidades de conservação. 

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Em 2020, 40% das áreas de garimpo estavam dentro de unidades de conservação. O aumento da atividade nesses locais nos últimos dez anos foi de 301%. Nas terras indígenas, o crescimento foi de 495%, e elas concentravam 9,3% das áreas de garimpo no ano passado. 

Nesta semana, o Supremo Tribunal Federal (STF) analisa se cabe ou não aplicar sobre as demarcações novas ou em andamento de terras indígenas a regra do “marco temporal”, uma espécie de linha de corte. Pelo entendimento do marco temporal, defendido por alas ligadas ao agronegócio, uma terra indígena só poderia ser demarcada se for comprovado que os índios estavam sobre a terra requerida na data da promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988.

Crise é uma das razões para aumento

A resposta para o avanço do garimpo pode estar na crise. Pedro Walfir, professor da Universidade Federal do Pará e coordenador do Mapeamento de Mineração no MapBiomas, diz que em tempos de instabilidade econômica o preço do ouro tende a aumentar consideravelmente, atraindo garimpeiros. "As bolsas de valores balançam e o ouro permanece um investimento tradicional, de baixo risco", explica. 

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Outro fator apontado pelo pesquisador é a falta de fiscalização tanto no Brasil quanto em outros países da Amazônia. O bioma concentra 93,7% da área de garimpo no País. Walfir explica que essa atuação ilegal traz prejuízos sociais especialmente para os indígenas, que acabam entrando em conflito para defender suas terras. Também traz danos aos próprios garimpeiros, uma vez que as condições de trabalho são quase sempre degradantes.

Apesar de ilegal, o garimpo em terras indígenas cresceu 495% nos últimos dez anos Foto: Hutukara Associação Yanomami

Outro problema do garimpo ilegal é o impacto sobre o meio ambiente. Os recursos hídricos sofrem bastante com a atividade porque os rios recebem uma quantidade muito grande de mercúrio. Isso afeta a qualidade da água e a biota. "O poder público, a iniciativa privada e a sociedade civil precisam se unir contra esse problema. Se o colapso ambiental não for enfrentado, o futuro é muito sombrio", afirma Walfir.

Rinaldo Mancin, diretor de Relações Institucionais do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), reclama que a mineração industrial sofre dano de reputação pelo garimpo legal. "Enfrentamos uma competição desleal com o garimpo. Há ainda o dano de concorrência, porque o garimpeiro invade a área já titulada pela mineradora e faz pressão para se instalar no local", diz.

Para Walfir, grandes empresas costumam ter plano de governança bem construído, para que seu produto seja bem avaliado no mercado, o que reduz o risco de danos em relação ao garimpo. “A mineração ainda é vista como uma atividade muito negativa, mas impacta menos que o agronegócio, quando feita de forma sustentável”, diz.

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Desenvolvimento da energia limpa depende do setor, diz diretor do Ibram

Mancin fala que o desenvolvimento e a popularização da energia limpa, aposta para frear a mudança climática, dependem da mineração. "As baterias dos carros elétricos dependem de minérios. A descarbonização e a transformação energética dependem do setor mineral", diz. 

Walfir concorda e diz que nos próximos anos deve haver uma corrida por minérios. Ele aponta que, para deixar a mineração mais sustentável e migrar para uma economia de baixo carbono, o País precisa regulamentar a produção de minérios. "Caso contrário, vamos continuar emitindo gás carbônico ao suprimir florestas para extrair a substância mineral", diz.

Outro fator sobre a mineração industrial que vem mudando nos últimos anos é a demanda por maios responsabilidade social. “Não adianta participar com 4% do PIB e não trazer melhoria de vida para as pessoas”, destaca o pesquisador da UFPA, que prevê a necessidade de mais envolvimento com as comunidades locais.

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O diretor do Ibram afirma que há um compromisso entre as grandes mineradoras e a sociedade para evitar acidentes como os rompimentos de barragens de Mariana, em 2015, e de Brumadinho, em 2019, ambas em Minas Gerais. As duas tragédias deixaram 289 mortos e causaram graves danos ambientais."Temos métricas bem definidas para evitar a qualquer custo o que for minimamente semelhante com aqueles acidentes", diz.

A reportagem tentou contato desde sábado, 28, com os ministérios de Meio Ambiente, Minas e Energia e a Fundação Nacional do Índio, mas não obteve resposta. 

Inteligência artificial ajuda no processamento de dados

Os dados inéditos divulgados pelo MapBiomas foram gerados a partir do processamento e interpretação de informações do satélite americano Landsat. Os pesquisadores extraíram e classificaram essas imagens com o uso de inteligência artificial. Depois, cruzaram esse mapeamento com as informações existentes nas bases de dados do governo.

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Walfir espera que os dados colaborem para a tomada de decisões sobre o futuro da mineração no Brasil. "A gente está apresentando dados contundentes sobre a mineração no País para que a sociedade tome uma atitude", afirma.

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