Greta desistiu da COP-27. Mas o que pensam os jovens ativistas brasileiros?

Mobilizadores defendem que é preciso ocupar espaços formais de discussão sobre o alerta climático e dizem que é hora de o ativismo da nova geração ter o rosto do Sul global

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Foto do author Leon Ferrari
Foto do author João Gabriel de Lima
Por Leon Ferrari, Emílio Sant'anna e João Gabriel de Lima
Atualização:

ENVIADO ESPECIAL A SHARM EL-SHEIK - A ativista sueca Greta Thunberg, de 19 anos, tem afirmado que está cansada do “blá blá blá” das cúpulas do clima e já sinalizou que não deve participar da COP-27, que ocorre até a próxima semana em Sharm el-Sheik, no Egito. Mas nem o desânimo de Greta, os altos custos para ir ao evento e as restrições impostas pela ditadura do país africano afastaram os jovens ambientalistas brasileiros - e de muitas outras nacionalidades - da conferência.

Se existe algo que faz falta até agora na COP são os protestos na frente da Zona Azul, onde os países montam seus pavilhões, e também a tradicional marcha de ativistas jovens no centro da cidade. O governo egípcio confinou os protestos a uma região longe da área central, e também do complexo de convenções que hospeda o evento.

Pavilhão da Juventude, na COP do Egito, tem programação intensa Foto: João Gabriel de Lima/Estadão

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Até esta quarta-feira, 9, não havia sinal de que isso iria mudar. A única manifestação permitida era a de militantes veganos, alguns deles com fantasias de animais, distribuindo comida saudável na frente da COP. (Comida muito bem-vinda, por sinal, pois dentro do espaço de eventos há poucos quiosques de alimentação, todos com filas enormes e preços abusivos).

O governo egipcio esta evitando protestos, mas os jovens continuam marcando presença na COP. Pela primeira vez, criou-se um pavilhao destinado a eles na Zona Azul. E é um dos espaços mais animados, sempre lotado, com gente de todos os cantos do planeta e dos doze aos trinta e poucos anos.

Ativista sueca tem ficado fora dos holofotes na discussão climática Foto: Henry Nichols/Reuters

Alguns figurões já passaram por lá, como o ex-prefeito de Nova York Michael Bloomberg. Há debates sobre todos os assuntos abordados na cúpula, mas sempre com enfoque destinado a um público jovem. Nas paredes coloridas, há papeis com mensagens de jovens do mundo todo sobre como combater a mudança climática.

A intenção dos mobilizadores brasileiros neste ano foi levar o maior número que fosse possível de jovens participantes. A edição anterior da COP, na Escócia, foi uma das que mais levaram a nova geração para cobrar soluções urgentes para frear a catástrofe climática.

Neste ano, o Engajamundo, organização de liderança que visa a enfrentar problemas ambientais e sociais do País e do mundo, está representada por uma delegação de 19 membros, com ativistas da Amazônia, do Cerrado, da Mata Atlântica, da Caatinga e do Pampa.

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Cada um deles quer trazer para o debate global questões e experiências ligadas ao próprio bioma onde vive. A presença no evento das Nações Unidas é um modo de reforçar o recado claro às lideranças mundiais: o tempo está se esgotando.

“Sou filho do Cerrado”, fala o historiador Anderson Costa, de 22 anos, de Porto Franco (MA). “Desde pequeno, sempre tive consciência de que minha casa estava sendo destruída. O Cerrado é um dos biomas mais destruídos. Já não existe mais de 56% da sua cobertura original, o que é muito perigoso”, alerta. “O sertão onde cresci já não está mais como era antes. O ativismo para mim não é só uma escolha, mas também uma responsabilidade”, completa.

A percepção de que as mudanças já estão aqui e nos afetam diretamente é compartilhada com Valdineia Sauré, de 26 anos. Ela é indígena, do povo Munduruku, que fica no Alto Rio Tapajós, em Jacareacanga (PA). “Quando ingressei na universidade, em 2014, comecei a entender como que o meu povo estava sendo afetado por projetos de desenvolvimento”, diz ela, formada em Gestão Pública. “Minha preocupação é falar sobre a luta do meu povo, a região onde vivo, que é uma das áreas que é mais afetada pelo garimpo ilegal.”

Sobre as acusações de Greta - de que as cúpulas climáticas têm muita conversa e pouca ação - os jovens do Engajamundo concordam, mas veem necessidade de mostrar presença. “Todos os espaços de tomada de decisão são muito cheios de blá blá blá, mas não é por isso que a gente vai parar de ocupar eles”, diz a cientista política Carolina Dias, de 22 anos, do Pampa gaúcho.

Um problema, reclama ela, é que a cada nova COP fica mais distante o espaço entre líderes e sociedade civil. “Os espaços onde é possível fazer ações de ativismo são muito restritos e inacessíveis”, afirma. “Os negociadores estão lá na zona verde, que fica bem distante (da azul). Os negociadores acabam não vendo as manifestações da sociedade civil.”

Também do Engajamundo, o sergipano Frances Andrade, de 26 anos, mestre em Ciências Florestais, destaca que Greta “abriu portas” para o ativismo jovem, mas avalia que é hora do Sul global ocupar esse espaço. “Quanto mais rostos, melhor”, defende.

Para o indígena João Victor Pankararu, de 26 anos, o momento é de levar a voz deles aos quatro cantos do mundo, e não de retroceder. Ele, que esteve na Semana Climática de Nova York, está no Egito liderando um processo de formação de lideranças da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib).

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“Estamos tentando deixar nossa mensagem para os líderes globais”, diz. “Quando a Greta diz que não vem, parece que nós jovens não queremos participar. Recai sobre todos os jovens, e não é verdade. Precisamos que outraos escutem o que estamos falando.”

Segundo ele, as regras mais rígidas no Egito não devem desanimar os participantes de ir para festas. O que muda, afirma, é a forma de protestar. “Eles têm regras mais rígidas, então estamos fazendo atos menores”, afirma.

Já para Pedro Tufic, do Impact Bank, talvez comece a surgir dissonância entre uma ativista branca e europeia com os jovens do Sul Global. “Ela (a Greta) proporcionou o nascimento de um movimento que oxigenou o debate”, diz. “Mas o Fridays for Future (movimento liderado pela sueca) não é só ela, tem capilaridade muito grande.”

Ele diz que não estará na COP neste ano por compromissos de trabalho, mas não vê nas dificuldades impostas pelo Egito um obstáculo instransponível. “Ano passado fomos em número recorde e acho que neste ano haverá ainda mais”, afirma.

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