Por IDS Brasil -
A Reforma Tributária está apenas na metade e os próximos meses serão fundamentais para que o Brasil avance em direção a uma estrutura tributária 3S: Saudável, Sustentável e Solidária
Depois de aprovada em dois turnos na Câmara, em 7 de julho, a Proposta de Emenda Constitucional 45/19, que trata da Reforma Tributária foi encaminhada para o Senado Federal. Em um primeiro momento pode parecer que as coisas estavam decididas, mas há muito ainda o que fazer para se conseguir uma estrutura tributária que dialogue com o Brasil do século 21 e abandone conceitos arraigados do século passado.
Há quem diga que essa reforma mascarou privilégios ao modelo de economia ainda ancorado à produção manufatureira e à agropecuária exportadora. O contraponto é que o país precisa de uma economia baseada em inovação, ciência, conhecimentos tradicionais e biodiversidade. Em entrevista recente o cientista Carlos Nobre aponta que o Brasil pode liderar a construção de uma nova economia da floresta em pé, que não existe em nenhum lugar do mundo. "Precisamos desenvolvê-la, se nós não fizermos isso, outros se aproveitarão de nossa biodiversidade".
No entanto, o atual momento, em que o Brasil discute uma estrutura tributária que deverá reorganizar as atividades econômicas, essa visão que inclui a economia da vida e da biodiversidade precisa ser parte do novo modelo tributário, que também incorpore os desafios climáticos entre outras demandas socioambientais urgentes.
O Brasil tem a pretensão de ser parte da "Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico" - OCDE - e pode utilizar o modelo de tributação utilizado pela organização como benchmarking para a reorganização dos impostos verdes no país. Os tributos incidem sobre resíduos e gases como dióxidos de nitrogênio e sobre a geração de resíduos que podem causar impactos posteriores ao consumo. Mesmo a volatilidade de alguns insumos, como solventes, merece a atenção dos legisladores. Ou seja, o olhar do arcabouço tributário é mais amplo.
Segundo o relatório recente da OCDE, impostos ambientais compreendem uma ampla gama de tributos, como os incidentes sobre combustíveis fósseis, motores, taxas de registro de veículos, taxas sobre poluição da água e sobre resíduos sólidos.
As receitas governamentais derivadas desses impostos são relativamente pequenas, cerca de 2% do PIB em média.
Audiências Públicas
Esta semana o Senado inicia sua agenda de Audiências Públicas sobre os principais temas da Reforma Tributária com o seguinte calendário:
- 22/08 - Diagnóstico, objetivos e conceitos
- 23/08 - Impacto no Setor de Serviços
- 29/08 - Impacto na Indústria
- 05/09 - Impacto no Agronegócio e no Cooperativismo
- 12/09 - Regimes específicos e diferenciados
- 19/09 - Impacto sob a ótica dos Estados
- 20/09 - Impacto sob a ótica dos Municípios
- 27/09 - Apresentação do Relatório
- 04/10 - Reunião da CCJ: Votação do Relatório
Há temas que ganharam caráter de urgência nessa discussão e que precisam de atenção não apenas nessa etapa de análise e votação no Senado, mas também quando o texto retornar à Câmara para uma segunda etapa de votação, quando as alterações propostas no Senado podem ser aprovadas ou descartadas.
Imposto Seletivo
O Imposto Seletivo está sendo questionado pela Indústria e corre o risco de ser retirado do texto ou simplesmente esvaziado. Essa sobretaxa deverá incidir sobre a produção, comercialização ou importação de produtos prejudiciais à saúde e ao meio ambiente. O objetivo da medida é desestimular o consumo de determinados bens ou serviços. Deve ser utilizado como política de proteção e prevenção.
ICMS Verde
Se a Reforma Tributária for aprovada como está, será o fim do ICMS Verde, uma política de sucesso que há 30 anos beneficia milhares de municípios, principalmente os pequenos e mais distantes dos centros urbanos, com volumes expressivos de compensação ambiental. Para preservar esse benefício é preciso substituir o atual ICMS Verde, que será extinto, pelo IBS Ecológico, como forma de garantir o repasse para os municípios que melhorem seus indicadores de meio ambiente, saúde e qualidade de vida da população, inclusive na área urbana. O repasse de apenas 0,5% da cota-parte dos municípios, garante a manutenção do maior programa de compensação socioambiental do planeta, estimado em R$6 bi/ano.
Fundo de Desenvolvimento Regional
Os Fundos de Desenvolvimento da Amazônia (FDA), do Nordeste (FDNE) e do Centro-Oeste (FDCO) estão entre os principais instrumentos de promoção do desenvolvimento regional no Brasil e devem promover a Economia Verde e estar alinhados com o Plano de Transição Ecológica. A atual modelagem desses fundos ainda carrega resquícios de uma visão defasada com fomento de infraestrutura e tecnologias poluentes e insustentáveis, simplesmente porque são as usuais e mais baratas. É preciso que os instrumentos de desenvolvimento regional promovam a inovação com sustentabilidade.
Impacto tributário
Cada item beneficiado com a alíquota de imposto reduzido tem reflexo direto na alíquota-padrão, que, por sua vez, impacta em toda a sociedade. O benefício de alíquotas reduzidas não deve ser uma benesse política, sua aplicação deve excluir produtos nocivos à saúde, ao meio ambiente ou altamente emissores de carbono. É preciso beneficiar com subsídios alguns insumos, como sementes, para potencializar nossa produção, mas não permitir que o Estado fomente, com alíquota reduzida, o comércio de produtos tóxicos e cancerígenos, como agrotóxicos, cigarros e bebidas alcoólicas.
Os próximos passos são fundamentais para que o Brasil emerja com uma economia capaz de oferecer qualidade de vida a todos. Por isso as organizações da Sociedade Civil unidas no propósito de uma sociedade justa e solidária propõe uma Reforma Tributária 3S - Saudável, Solidária e Sustentável: https://pelacidadania.org.br/reforma-tributaria-3S/
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