Mancha de óleo no Nordeste ameaça tartarugas, aves e peixe-boi

Especialistas dizem que o petróleo cru pode afetar a digestão dos animais, o desenvolvimento de algas e também a saúde humana

PUBLICIDADE

Por Michelle Ferret e Marina Cardoso

NATAL - O espalhamento de óleo no litoral do Nordeste ameaça tartarugas, aves e o peixe-boi marinho, o mamífero dos oceanos mais ameaçado de extinção do Brasil. Segundo especialistas, o petróleo cru pode afetar a digestão dos animais e o desenvolvimento de algas, essenciais para a cadeia alimentar dessas espécies. Além disso, alertam, há possíveis riscos para a saúde humana.

PUBLICIDADE

O vazamento do óleo já atinge 138 localidades, nos nove Estados da região.

"Sem dúvida é o maior desastre ambiental no litoral do Nordeste do Brasil", afirma Flávio Lima, coordenador geral do Projeto Cetáceos da Costa Branca da Universidade Estadual de Rio Grande do Norte (UERN).

Ele e sua equipe estão envolvidos no atendimento de animais contaminados pelo óleo, cuja origem é atribuída à Venezuela, segundo análises feitas pela Petrobrás. Nesta quarta-feira, 9, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, declarou que a origem do vazamento seria um "navio estrangeiro"

Até o momento, em todo o Nordeste, 16 tartarugas-marinhas, espécie ameaçada de extinção, foram contaminadas pela substância. Por isso, em Sergipe, o Projeto Tamar deixou de lançar 800 tartarugas no oceano.

"A morte das tartarugas é apenas a parte mais imediata das consequências do vazamento", avalia Lima. 

Só dois animais encontrados seguem com vida. Uma tartaruga-marinha que está no Centro de Descontaminação de Fauna Oleada da Uern, em Mossoró, único local no Nordeste que oferece estrutura completa para a recuperação dos animais resgatados com óleo. A outra aguarda estabilização do quadro para ser transferida para a unidade. 

Publicidade

O material observado é denso, com odor forte característico e se espalha em borrões pelas praias e areias. O petróleo cru é perigoso e agressivo para a saúde humana e animal, por ser composto de uma mistura complexa de componentes orgânicos e 70% de hidrocarbonetos. 

Segundo a pesquisadora Liana Mendes, da ONG Oceânica, vinculada à Universidade Federal do Rio Grando do Norte (UFRN), ainda que o óleo tenha um tempo de vida relativamente curto no ambiente aquático, a fração derramada é altamente tóxica para os organismos.

"Como efeito, ele pode afetar na digestão dos mamíferos, resultando em debilidade na ingestão de nutrientes, o que pode levar à morte", explica. "Outro desdobramento na cadeia ecossistêmica é que o óleo pode afetar o crescimento e produção de algas e algumas outras espécies que são fundamentais para a vida marítima", complementa. 

Animal contaminado por óleo em estabilização Foto: Projeto Cetáceos/Flávio Lima

A pesquisadora lembra que outra substância perigosa no petróleo cru é o benzeno, associado ao carcinogênico. Essa substância pode ocasionar a diminuição dos glóbulos brancos em humanos.

"Com isso, as pessoas ficam susceptíveis a infecções", afirma.

Moradores da praia de Santa Rita (RN), um dos locais afetados, Rejane Silveira e Zélia Lopes disseram que, no último fim de semana, seus filhos, de 10 e 12 anos, voltaram do mar "cheios de pixe".

"Ficamos muito assustadas e colocamos eles no banho. Tinha 'graxa preta' em todo lugar, no cabelo, nas orelhas e conseguimos retirar com óleo de cozinha", diz Rejane. 

Publicidade

Monitoramento de praias e coleta de amostras de óleo pela equipe do Projeto Cetáceos da Costa Branca-UERN Foto: Projeto Cetáceos/Flávio Lima

O "bugueiro" Francisco Sales, que faz passeios pelo litoral nas praias da Redinha e de Santa Rita, também relatou ter visto vários banhistas com óleo no corpo.

"Tem dias que aparece mais, outros menos. E o que mais entristece é ver as tartarugas com óleo, morrendo. Além disso, prejudica o passeio com os turistas, o movimento ao redor. É a primeira vez que vejo isso acontecer", lamenta.

Gelo e óleo de cozinha são recomendados a banhistas que entraram em contato com poluente

Para alertar a população, o Instituto de Defesa do Meio Ambiente em Natal (Idema), juntamente com o projeto Tamar, elaborou material educativo com os procedimentos que devem ser tomados em caso de contato com o óleo ou tiver conhecimento de um animal contaminado. 

É preciso evitar o contato com o óleo e, caso aconteça, colocar gelo no local ou retirar com óleo de cozinha. Caso a pessoa tenha reação alérgica, procurar urgentemente atendimento médico.

Segundo o diretor geral do Idema, Leonlene Aguiar, todos os municípios estão orientados para a coleta feita pela limpeza urbana, de forma adequada, com pá, luvas e sem utilização de máquinas. 

Publicidade

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.