GENEBRA - O governo brasileiro respondeu às críticas da Organização das Nações Unidas (ONU) em relação ao desastre de Mariana dizendo que cabe às empresas a "principal responsabilidade" pelo rompimento da barragem, em 2015. Nesta quinta-feira, 15, os peritos da entidade apresentaram no Conselho de Direitos um informe apontando que a resposta das autoridades brasileiras e da Samarco não foi suficiente e que o governo federal tem uma capacidade "limitada" para garantir a segurança nas demais barragens do País.
"Deve ficar claro que, em casos como o colapso da barragem de Fundão, a principal responsabilidade sobre a reparação recai sobre as empresas diretamente envolvidas no assunto, como ficou estabelecido num acordo assinado no dia 2 de maço de 2016 entre Samarco, Vale, BHP Biliton com autoridades para remediar os impactos de direitos humanos, restabelecer o meio ambiente e restaurar as atividades socioeconômicas afetadas ", disse a embaixador do Brasil na ONU, Regin Dunlop.
Ao Estado, o chefe do grupo de peritos da entidade, Dante Pesce, afirmou que "não concorda com a posição do Brasil". "Foi o fracasso do sistema de licenciamento e de controles", atacou.
O documento foi realizado pelo Grupo de Trabalho da ONU sobre Direitos Humanos e Empresas Multinacionais e que visitou o Brasil em dezembro do ano passado para avaliar o impacto do desastre e a resposta do governo e de empresas.
O informe revela que o Brasil não está preparado para lidar com tais incidentes e que projetos no Senado vão no sentido contrário ao que seria desejável, reduzindo o número de controles para licitações de obras de infraestrutura.
O grupo de trabalho visitou o Estado de Minas Gerais depois do desastre do dia 5 de novembro de 2015 e se reuniu com autoridades, empresários, sociedade civil e grupos de vítimas. Segundo a avaliação, 3,2 milhões de pessoas tiveram suas vidas afetadas. "O barro viajou mais de 600 quilômetros ao oceano, matando peixes, fauna e flora e causando uma crise ambiental e social importante que afetou o acesso à água para a população, inclusive para a comunidade indígena de Krenak e milhares de pescadores ", constatou a ONU.
"Dada a dimensão do desastre, o Grupo de Trabalho considera que o governo federal e estadual poderiam ter feito mais depois do ocorrido", indicou a ONU. "Ainda que o gabinete da presidente (Dilma Rousseff) tenha informado o Grupo de Trabalho sobre os esforços que tem feito, membros de comunidades afetadas indicaram a necessidade das autoridades federais e estaduais de dar mais informação sobre o processo de reassentamento e compensações ", constatou o documento da ONU.
A entidade lembra que "ainda que a Samarco seja responsável por reparar o dano causado, o governo federal continua sendo o principal responsável por respeitas os direitos humanos das comunidades afetadas".
Em março deste ano, a Samarco e as autoridades brasileiras chegaram a um acordo sobre as compensações. Mas a ONU alerta para a importância de se realizar uma "avaliação completa do nível de danos" e que seja garantida uma "compensação adequada para cada pessoa afetada, com base em uma consulta completa com cada um afetado". O grupo de trabalho ainda fez questão de apontar que "nenhum acordo financeiro pode trazer de volta aqueles que perderam suas vidas ou compensar completamente pelo sofrimento gerado".
A entidade ainda cobrou o Brasil no que se refere ao controle de barragens e se disse "preocupada". "O grupo de trabalho está preocupado que, com o grande número de barragens e locais de mineração em Minas Gerais e no Brasil, exista uma capacidade limitada do Estados e do governo federal para conduzir inspeções de segurança para garantir que essa tragédia jamais volte a ocorrer", apontou.
Segundo a ONU, encontros com os executivos da Samarco, Vale e BHP Billiton foram realizados. Mas apontou que "comunidades afetadas estão preocupadas sobre o apoio recebido para reconstruir suas vidas e preocupadas sobre os riscos para a saúde do rio contaminado".
"As pessoas não confiam na informação dada pela Samarco, incluindo as garantias sobre material tóxico e que a água é segura", disse. "Eles estão também preocupados de que outras barragens podem colapsar. O Grupo de Trabalho nota que levou quase duas semanas para que a Samarco anunciasse que outras duas estruturas não eram seguras e que houve um fracasso do plano de contingência da empresa, já que as pessoas não foram alertadas sobre o desastre, apesar das dez horas de intervalo entre a ruptura e o incidente em Barra Longa. Avisos teriam permitido que as pessoas salvassem seus pertences e vidas ", constatou a ONU.
A entidade pede que a Samarco seja transparente e que informações sejam repassadas à população. Segundo a ONU, a empresa precisa " criar um ambiente em que as pessoas, inclusive funcionários, possam expressar suas preocupações sem o temor de uma represália ".
A Secretaria de Estado de Meio Ambiente de Minas afirmou ter "tomado todas as medidas cabíveis". Conforme a Samarco, após a "visita, em dezembro de 2015, novas ações foram e continuam sendo implementadas, visando a reparar os danos causados pelo acidente".
Posicionamento. A Samarco informou que "após a visita dos representantes da ONU à Mariana, em dezembro de 2015, novas ações foram e continuam sendo implementadas visando reparar os danos causados pelo acidente". A empresa disse ter realizado mais de 300 reuniões com moradores das regiões afetadas para "sanar dúvidas e fornecer informações atualizadas".
"Vale ressaltar que o Acordo assinado pela empresa com os governos federal, de Minas e do Espírito Santo em março, e que foi homologado pela Justiça em maio, coloca como premissas básicas a transparência, a participação e diálogo constante com a comunidade. Cabe destacar ainda que, dos 41 programas previstos no Acordo, 93% já estão em andamento, com ações socioeconômicas e socioambientais", declarou a Samarco.
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