Niterói vai pagar para morador que reduzir emissões de gases de efeito estufa

Programa de neutralização de carbono vai começar em favela de cidade fluminense com incentivo para aumentar a reciclagem de lixo e o uso de bicicletas

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Por Eduardo Geraque
Atualização:

Um programa de neutralização de carbono começa a ser implementado em julho em mil residências da favela do Caramujo, um bairro de Niterói, região metropolitana do Rio. Os moradores, após um mês de capacitação, vão começar a perseguir metas de redução de emissões em suas rotinas residenciais. Na medida em que conseguirem resultados, terão direito a receber recursos em forma de araribóias, uma moeda social criada pela prefeitura este ano e já aceita em mais de 30 mil estabelecimentos comerciais.

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“É mais fácil do que parece falar sobre mudanças climáticas para as pessoas que estão em situação de vulnerabilidade social”, afirma Luciano Paez, secretário de Clima da cidade, administrada pelo engenheiro florestal Axel Grael (PDT), irmão dos medalhistas olímpicos Torben e Lars. “As mudanças climáticas, todos os dados e estudos mostram, vão ocorrer nas cidades e afetarão, mais ainda, as pessoas em situação de risco”, explica Paez.

Para conseguir uma renda extra – a tabela de valores está atrelada à porcentagem de redução de carbono atingida –, os moradores precisam atuar em três frentes. Aumentar a reciclagem de lixo, diminuir o gasto energético e mudar o hábito de transporte. Bicicletas serão oferecidas pela prefeitura para que a comunidade passe a utilizá-las mais. O desenho do programa, que está sendo considerado pioneiro no Brasil por atingir uma comunidade em áreas urbanas, prevê o monitoramento dos processos por parte de assistentes sociais do município.

Moradores de comunidade de Niterói, no Rio, terão metas de emissões de carbono. Na medida que conseguirem resultados, terão direito a receber recursos em forma de araribóias, uma moeda social criada pela prefeitura. Foto: Bruno Eduardo Alves/Prefeitura de Niterói

“O negacionismo climático do governo federal fez com que as cidades e os Estados assumissem o protagonismo nessa área ambiental”, avalia Flávia Bellaguarda, gerente de Relações Internacionais do Centro Brasil no Clima (CBC). “Os relatórios do IPCC (painel das Nações Unidas sobre o aquecimento global) deixam claro. Os eventos climáticos extremos vão atingir principalmente as áreas urbanas, onde está a maior parte da população do planeta”, afirma Flávia.

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O exemplo de Niterói, segundo a representante do CBC, pode ser colocado ao lado de outras estratégias com foco em mudanças climáticas de cidades como Recife e Fortaleza. A capital de Pernambuco elaborou um plano climático com quatro eixos estratégicos definidos como prioritários à mitigação e adaptação à mudança climática na cidade, detalhando os objetivos, metas e ações que levarão à redução das emissões.

O secretário Luciano Paez (de máscara verde) participa plantação de árvores no Caramujo, comunidade escolhida para projeto piloto de neutralização de carbono. Foto: Prefeitura de Niterói/Divulgação

A construção deste plano de ação contou com a participação da sociedade civil, de técnicos das diversas secretarias da gestão municipal e da academia. Os eixos de Energia, Saneamento, Mobilidade e Resiliência foram os definidos como prioritários.

Programa da ONU

Fortaleza também tem um plano semelhante, estruturado para 2040. As duas capitais do Nordeste, mais Niterói, fazem parte ainda da lista de cidades do programa Race to Zero, no âmbito das Organizações das Nações Unidas (ONU). São municípios que assumiram o compromisso de serem carbono zero até 2050. “Muitas dessas iniciativas são frutos de líderes públicos preocupados com o tema. O grande desafio é transformar todos esses projetos em políticas públicas duradouras”, afirma Flávia. “É um tema que não pode mais morrer.”

Para que isso não ocorra, explica Marina Esteves, analista de projetos em meio ambiente do Instituto Ethos, é importante que as ações sejam, por exemplo, transformadas em lei, para que as mudanças em nível regional se cristalizem. “No caso do Recife, foi feito o Decreto de Emergência Climática”, lembra Marina. A representante do Ethos também cita exemplos positivos no trato com as questões climáticas em curso na cidade de Petrópolis. “São Paulo, agora, também tem uma secretaria para o clima.”

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Como as questões municipais e estaduais são fundamentais na visão do Instituto Ethos, a instituição está preparando uma carta de recomendações aos candidatos aos governos locais nas eleições de outubro. “As ações são de caráter operacional para ajudar os executivos estaduais a assumirem responsabilidades em sintonia com os compromissos do Acordo de Paris”, explica Marina.

Todas as propostas – e outro documento será lançado também antes das eleições, voltado para o nível federal – estão focadas em pilares cruciais para o desenvolvimento social do País, na visão dos dirigentes do Ethos, como direitos humanos, transparência, clima e meio ambiente. “A multiplicidade de atores, incluindo o setor privado, é essencial nesses processos”, diz Marina.

A pesquisadora reconhece que implementar muitas das ações tem custo alto e, até por isso, a questão do financiamento é central. “Dos mais de 5 mil municípios que o Brasil tem, aproximadamente 30 têm algum plano climático. E muito porque foram esses que conseguiram algum tipo de financiamento internacional”, diz Flávia.

Para a especialista, em todo esse caldeirão que precisa ser mexido para que as cidades e os Estados possam enfrentar as mudanças climáticas e mitigar o aquecimento global, a pressão popular ainda continua como um dos ingredientes mais importantes. “Existem caminhos. Penso que estamos em um daqueles saltos de era, que as ideias inovadoras e ambiciosas terão um papel muito importante”, avalia Flávia.

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