No ano da COP-30, 4 questões ambientais que podem virar dor de cabeça para Lula

Brasil lida com dilemas que podem abalar imagem do País em meio a negociações de evento da ONU; governo tem defendido esforços de redução do desmatamento e fala em priorização da pauta climática

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Foto do author Paula Ferreira
Atualização:

BRASÍLIA- O Brasil receberá em novembro a Cúpula do Clima das Nações Unidas (COP-30), em Belém, mas vive internamente uma série de conflitos ligados ao meio ambiente. Algumas dessas questões - como a escalada de incêndios florestais e a possível exploração de petróleo na margem equatorial da foz do Rio Amazonas - podem aumentar a pressão sobre a gestão Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Obras de infraestrutura na Floresta Amazônica, como o asfaltamento de um trecho da BR-319 e a construção da Ferrogrão são defendidos como estratégicas para a economia, mas problemáticas do ponto de vista de preservação do bioma. Desde o início do seu 3º mandato, o presidente tenta se projetar como liderança global nas negociações climáticas.

Projetos de infraestrutura na Amazônia e exploração de petróleo podem motivar cobrança a Lula e Marina Silva Foto: Wilton Junior/Estadão

O Estadão lista quatro pontos sensíveis para o governo na área. Procurados para comentar, os ministérios do Meio Ambiente e dos Transportes não se manifestaram. A gestão Lula tem falado em priorização da pauta ambiental e cita, entre seus principais esforços, a expressiva redução do desmatamento na Amazônia, que caiu 30,6% em um ano. Procurado pela reportagem para comentar, o Ministério do Meio Ambiente não se manifestou.

Escalada de incêndios

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Queimadas na floresta, no Pantanal e no Cerrado têm sido um dos principais desafios para o Ministério do Meio Ambiente. No ano passado, o recorde de incêndios em alguns desses biomas expôs as falhas do governo na prevenção do fogo e na agilidade de resposta à crise. No caso da Amazônia, foi o número mais alto de queimadas em 17 anos.

Marcada para novembro, a Cúpula ocorrerá durante parte da estação seca da Amazônia. Em novembro, o Pará liderou o número de focos de incêndio no País, com fumaças cobrindo os céus das cidades, como Santarém, o que também aumenta o risco de doenças respiratórias.

Cidades como Santarém, no Pará, chegaram a ficar totalmente encobertas pela fumaça Foto: Reprodução/TV Globo

Em ambos os períodos, o governo federal foi criticado por sua atuação na resposta à crise. Especialistas consideram que caso o problema se mantenha em 2025, o tema poderá atrapalhar a atuação do Brasil na COP-30 e prejudicar a imagem internacional do país.

O governo tem afirmado que ampliou os investimentos nas ações antifogo, atuou para aperfeiçoar a legislação e aumentou a contratação de brigadistas. O governo tem falado também que a crise climática piorou a gravidade de fenômenos extremos, a exemplo da seca recorde no Brasil no ano passado.

BR-319 no coração da floresta

O governo federal tem o plano de pavimentar a ligação entre Manaus e Porto Velho, na BR-319, no coração da Amazônia. Ambientalistas veem a obra com ressalvas - para eles, a estrutura vai aumentar o risco da entrada de grileiros e madeireiros em um dos trechos mais preservados da floresta. O governo diz que vai atuar para impedir crimes desse tipo.

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A obra está no meio de uma batalha judicial após ação movida pelo Observatório do Clima para questionar o licenciamento ambiental dado pelo Ibama ainda na gestão Jair Bolsonaro (PL) para autorizar a pavimentação. Após liminar que suspendeu a licença, uma decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) derrubou a medida. O Observatório do Clima recorreu.

Em setembro, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, afirmou que a obra precisa passar por análise baseada em dados e evidências. Segundo ela, é fundamental “um estudo, uma avaliação ambiental estratégica, para que não se tenha o agravamento da grilagem e do desmatamento naquela área, que é no coração da Amazônia”, disse.

No mesmo mês, em visita à Amazônia, Lula citou a estiagem recorde na região para justificar a necessidade da obra. “Enquanto o rio estava navegável, cheio, a rodovia não tinha a importância que tem, enquanto o Rio Madeira estava vivo. Não podemos deixar duas capitais isoladas”, disse ele, afirmando que seria necessário garantir que a obra não resultaria em alta do desmate.

Em nota, o Ministério dos Transportes afirmou que “vem trabalhando e construindo um caminho para que se possa cumprir todas as exigências do Ibama”. A pasta afirmou ainda que está alinhando a obra às diretrizes dadas pelo Ministério de Meio Ambiente “para fortalecer a Governança Ambiental e Fundiária, alinhando ao Plano Ação para Prevenção e Controle de Desmatamento da Amazônia (PPCDAM).”

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Ferrogrão

Considerada o principal projeto ferroviário do País, a Ferrogrão foi desenhada em 2014. A ideia é facilitar o escoamento de grãos pelos portos do Norte do País. O projeto, defendido pelo agronegócio, é de que a ferrovia ligue Mato Grosso ao Pará. A obra está embargada desde 2021 por liminar dada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes e espera parecer da Procuradoria-Geral da República.

Mais uma vez o questionamento se dá pelo fato de a proposta cruzar uma área de proteção ambiental. Ambientalistas indicam que o projeto causaria a supressão de parte do Parque do Jamanxim, no Pará. Ao Estadão/Broadcast em setembro, o secretário executivo do Ministério dos Transportes, George Santoro, afirmou que a área não será afetada.

O Ministério dos Transportes afirmou que está sendo elaborado um Estudo de Impacto Ambiental que será submetido à aprovação do Ibama, da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Os órgãos deverão emitir pareceres técnicos sobre a viabilidade ambiental do projeto e possíveis medidas compensatórias.

Conforme a pasta, “o traçado da Ferrogrão respeitará as delimitações das Unidades de Conservação do seu entorno, assim como todas as definições legais referente aos Territórios Indígenas.” O governo estima que a ferrovia pode reduzir R$ 7,9 bilhões em desperdícios por ano devido à melhora na logística

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Exploração de petróleo na Amazônia

Desde a COP-28, em 2023, o governo brasileiro vive uma saia justa devido à intenção de explorar petróleo na Foz do Rio Amazonas. O tema mais uma vez deve vir à tona durante a cúpula climática de Belém, principalmente pelo fato de o Brasil ser o anfitrião.

O governo tem dado sinais divergentes sobre o tema. No cenário internacional, se posiciona a favor da transição energética e em defesa do fim do uso de combustíveis fósseis. Já no âmbito doméstico Lula disse publicamente que é “certo” que o País vai explorar o recurso.

Com a presidência da COP em mãos, o país será demandado a influenciar as discussões sobre o tema, já que a eliminação do uso de combustíveis fósseis é a principal estratégia para redução do aquecimento global. Nos bastidores, a exploração do recurso opõe a área ambiental do governo e o ministério de Minas e Energia, favorável à proposta.

Em outubro, o Ibama manteve a posição inicial de indeferir pedido da Petrobras para investigar petróleo na Margem Equatorial, próximo à foz do Rio Amazonas. Na ocasião, o presidente do órgão, Rodrigo Agostinho, minimizou a decisão. “O que teve foi um pedido de informações sobre uma base que a Petrobras está propondo fazer na região da possível área de exploração no Foz do Amazonas, mas não teve rejeição”, disse.

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Um dia após o parecer do Ibama, a diretora de Exploração e Produção da Petrobras, Sylvia dos Anjos, disse que está “otimista” em perfurar a foz do Amazonas para buscar petróleo.

Em nota, a Petrobras afirmou que considerou “importante avanço” o pedido de mais informações feito pelo Ibama. Disse ainda estar aberta a atender às exigências ambientais e acrescentou que constrói uma nova unidade de fauna no Oiapoque, que funcionará em conjunto com o centro de despetrolização de fauna em Belém.

“As atividades exploratórias na Margem Equatorial representam mais um passo no compromisso da Petrobras em buscar a reposição de reservas brasileiras, assim como o desenvolvimento de novas fronteiras exploratórias, que assegurem o atendimento à demanda global de energia durante a transição energética”, disse na nota a diretora de exploração e produção da companhia, Sylvia Anjos.

O Estadão também questionou o Ministério do Meio Ambiente e o Ministério de Minas e Energia, mas não obteve resposta.

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