BRASÍLIA - Nomeado pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, para comandar o Ibama na Bahia, o superintendente Rodrigo Santos Alves cancelou atos de sua própria equipe técnica no Estado para liberar obras de um resort de luxo, erguidas sobre a areia da Praia do Forte, numa região conhecida pela procriação de tartarugas marinhas. Alves não só retirou uma multa de R$ 7,5 milhões que havia sido aplicada pelos técnicos do Ibama contra o hotel como anulou a decisão que paralisava a obra.
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Além do cargo de superintendente do Ibama na Bahia, assumido em junho do ano passado por escolha de Salles, Rodrigo Santos Alves é sócio de uma empresa imobiliária, que atua na oferta de imóveis de luxo no litoral.
O Tivoli Ecoresort, onde as diárias vão de R$ 1,5 mil a R$ 7 mil, iniciou a construção de um muro na areia da praia para conter o processo de erosão em frente ao hotel. A situação é causada pela deterioração das restingas, vegetação que cobre a areia. O muro de gabião, montado com pedras acumuladas em armações de aço, começou a ser instalado em uma faixa da areia, diretamente na praia, diante das instalações do hotel.
A crítica dos especialistas ambientais é de que esse tipo de estrutura, que fica submersa, enterrada na areia, compromete a procriação das tartarugas, que avançam para a margem para desovar. O resort está localizado na mesma praia do Projeto Tamar, programa do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) de proteção aos animais marinhos.
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Em julho deste ano, após vistoria no local, os técnicos do Ibama autuaram a empresa e determinaram o embargo de “todas e quaisquer atividades relacionadas à construção em faixa de areia da praia do empreendimento”. Àquela altura, a Secretaria de Patrimônio da União (SPU), órgão vinculado ao Ministério do Planejamento, também tinha embargado a obra pelo mesmo motivo.
Em setembro, porém, Rodrigo Santos Alves rejeitou as notificações do Ibama, sob o argumento de que o hotel já possui licença ambiental dada pelo município de Mata de São João, onde está instalado, e que o Ibama não pode se sobrepor a essa autorização. Apesar de as obras ocorrerem diretamente na faixa de areia da praia, que pertence à União, o superintendente do Ibama alegou que se trata de uma intervenção que acontece em área de domínio do hotel.
“O licenciador deve balancear os valores complexos e muitas vezes conflitantes entre o impacto ambiental e a importância da atividade ou empreendimento, visando sempre promover a ‘harmonia produtiva e agradável entre o ser humano e seu meio ambiente’”, justificou o superintendente, na decisão que anula os atos.
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O município, afirmou Alves, licenciou “a obra de construção de muro dentro dos limites do imóvel” e considerou “o baixo impacto ambiental da obra, a importância sócio-econômica do empreendimento”, além de “questões próprias de quem deve pensar no meio ambiente urbano em toda sua complexidade”.
Alves é sócio da corretora de imóveis Remax Jazz, que atua em gestão de imóveis de luxo no litoral baiano. Ele não esteve no local das obras, não viu a intervenção pessoalmente, mas decidiu que “no caso concreto, em que há nos autos referências (inclusive fotos) de licenças e alvarás que o município entendeu suficientes para autorizar a obra”, não cabe ao Ibama “o papel de corregedor do processo municipal” e suas licenças locais. “Falta sustentação à ação fiscal, por falta mesmo de materialidade”, concluiu.
Depois de analisar a obra, a equipe técnica do Ibama, acompanhada de membros do Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio), entendeu que a construção tinha de ser paralisada. O Ministério Público Federal, que passou a atuar no caso, também tem o mesmo entendimento. “Estão acontecendo várias intervenções desse tipo no litoral. Não podemos deixar que isso se imponha de qualquer forma. Há um afrouxamento legal, que deve ser combatido”, diz a procuradora Bartira Araújo Góes.
Questionado sobre o assunto pelo Estadão, Alves afirmou que não há acusação sobre o hotel “estar executando obras além do licenciamento existente”. “O que há é um inconformismo com o licenciamento, que desafia a via judicial, e não administrativa”, comentou.
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Atropelo
No último mês de setembro, Salles tentou levar adiante uma resolução que fragilizava a proteção de áreas de restinga e manguezais. Com o controle do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), Salles conseguiu aprovar a mudança que abria espaço para a exploração imobiliária, mas a resolução acabou sendo suspensa por decisão do Supremo Tribunal Federal.
Atualmente, a obra na Praia do Forte está paralisada. Dentro do Ibama, o caso provocou um impasse administrativo. A divisão responsável pela “conciliação ambiental”, que negocia possíveis acordos com aqueles que são multados, resolveu não acatar a decisão do superintendente da Bahia por entender que Rodrigo Santos Alves ignorou fases do processo, como a análise preliminar da multa e a audiência de conciliação ambiental, que deveria ser feita com o hotel autuado.
“Entende-se que o julgamento do auto de infração pela autoridade julgadora deve ocorrer só após a realização da audiência de conciliação ambiental e após encerrada a instrução processual pela Equipe de Instrução de primeira instância”, decidiu o Serviço de Apoio à Análise Preliminar do Ibama. Dessa forma, a divisão informou que “dará continuidade à análise preliminar deste auto de infração, em cumprimento às suas competências legais”.
O Tivoli Ecoresort tem origem portuguesa e faz parte do Grupo Hoteleiro Minor Hotels, que opera 13 propriedades em Portugal, Brasil e Qatar. É um dos maiores grupos hoteleiros do mundo. Em nota, a empresa afirmou, por sua vez, que o objetivo da obra é conter o avanço do mar sobre a estrutura do hotel. Por meio de nota, a empresa declarou que intervenções do mesmo tipo já ocorreram na região e que sua obra acontece dentro da área da propriedade.
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