As obras emergenciais feitas pelo município para conter a cratera que ameaça atingir a área urbana de Lupércio, no interior de São Paulo, são insuficientes para frear a erosão, diz o especialista Claudio Luiz Ridente, do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), que inspecionou a cratera na quarta-feira, 24. Segundo ele, é necessário aproveitar a época de seca para reforçar a estrutura antes da volta das chuvas.
Ridente prepara um relatório com medidas para recuperar o local a ser entregue à Defesa Civil Estadual. A cratera tem 300 metros de comprimento, 25 de largura e 15 de profundidade, e muito próxima da Rua Dr. Adamastor Ferreira Costa e da Avenida Santo Inácio.
Ridente disse ao Estadão que, embora as medidas emergenciais fossem necessárias, as intervenções no local, como as obras de terraplanagem e colocação de manta especial, impediram avaliação mais completa do processo erosivo.
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“O ideal seria termos ido ao local antes de mexerem. Para usar a linguagem policial, a cena do crime foi alterada, mas deu para ver que o que foi feito lá não é suficiente. São medidas que vão retardar a evolução do processo, mas são necessárias outras intervenções ainda nessa fase emergencial”, afirma.
Procurada, a prefeitura de Lupércio ainda não se manifestou. A Coordenadoria Estadual da Defesa Civil informou que espera o relatório do IPT para estudar medidas de contenção da voçoroca, em conjunto com o município.
O risco é de que o aterro na cabeceira e a geomembrana (lona de polietileno de alta densidade) colocada no local não resistam a um temporal. “Vamos propor medidas de reforço para evitar que o processo chegue nas vias e ameace as casas”, diz Ridente.
“Estamos analisando dados, além de fotos e vídeos mais antigos que mostram a evolução. Será preciso melhorar o que está feito e manter monitoramento contínuo nos próximos meses até termos as medidas definitivas”, continua.
Sistema de drenagem urbana precisa ser reestruturado
Ridente lembra que a erosão atingiu o lençol freático e já é considerada uma boçoroca, processo erosivo mais grave. “Observamos que a cratera já apresenta evoluções laterais, ou seja, a água solapa a base do talude e ele cai - com chuva ou sem chuva. A recuperação é mais cara, envolve estudos hidrológicos, hidráulicos, geológicos e geotécnicos, mas é possível corrigir, conduzindo as águas subterrâneas e superficiais da forma adequada”, explica.
O estudo vai recomendar um redimensionamento no sistema de drenagem da área urbana, que usa tubulação de 0,70 m e já não comporta toda a água que recebe. Ele observa que a erosão aconteceu na linha dessa tubulação.
Na semana passada, a Defesa Civil havia apontado a hipótese de uma falha na galeria pluvial ter agravado o problema. “Parcialmente na análise da vistoria mostrou que essa falha na galeria pluvial é um dos fatores preponderantes. Mas não podemos falar somente por causa da galeria pluvial, pois tem a questão da chuva”, disse o capitão Roberto Farina.
Aterrar a cratera, embora possível, não é a solução que ele recomenda. “De onde virá o material para encher o buraco? Se buscar longe, precisa ter uma área de empréstimo para depositar o material. Isso cria impacto em outro local. É uma alternativa cara e complicada do ponto de vista ambiental “, diz.
Para ele, a melhor opção é movimentar a terra no entorno da cratera dando outra configuração topográfica para a área. “Suavizando os taludes, há perda lateral de área, mas é possível instalar áreas verdes para melhorar a estabilidade do solo e usar a terra para um aterro na base da voçoroca, criando um parque com trilhas de visitação”, diz.
Esse custo, de acordo com o especialista, é menor do que recompor o terreno original, mas ainda assim uma obra cara.
Inação eleva custo de reparo em até 20 vezes, diz especialista
Ridente lembra que, em 2021, o IPT fez um projeto para controlar uma erosão no distrito de Santa Terezinha, na zona rural de Lupércio. “Na ocasião, o prefeito nos mostrou essa cratera mais próxima da cidade e sugerimos alternativas, mas nada foi feito. Lá atrás seria uma solução mais fácil e menos onerosa. Deixar chegar do tamanho que ficou, agora tem custo enorme, 15 a 20 vezes maior”, afirma.
Conforme o especialista, o estudo do IPT abrange também a recuperação das áreas abaixo da cratera. “Quando temos um processo erosivo desse porte, gera-se uma área degradada na região, mas o impacto maior é nos recursos hídricos à jusante. O solo que saiu dali foi parar nos corpos d’água e linhas de drenagem que ficam abaixo. Aí passamos a ter inundações onde não havia’, diz.
No IPT insistimos que, além de conter a erosão, é preciso avaliar os recursos hídricos à jusante para trabalhar essas áreas e desassorear onde for preciso”, acrescenta Ridente.
O IPT atua como braço técnico da Defesa Civil do Estado e contribui com projetos na área de geologia, mas a decisão do que será feito é do município. “Fazemos os estudos e entregamos à Defesa Civil. O valor depende de qual alternativa será empregada efetivamente. A cidade é pequena e não tem orçamento para uma obra desse porte, mas é uma questão urgente e sabemos que o município está em busca de recursos para isso.”
Caso foi parar na Justiça
O avanço da cratera em direção à cidade levou o Ministério Público Estadual a mover ação civil pública para obrigar o município a informar que medidas tem tomado para frear a erosão. No último dia 18, a juíza Renata Lima Ribeiro Raia, do 1ª Vara da Comarca de Garça, atendeu o pedido do MP dando prazo de cinco dias ao município para adotar medidas, sob pena de multa diária de R$ 10 mil, até o valor máximo de R$ 1 milhão.
O Estadão entrou em contato com a assessoria de imprensa da prefeitura, o gabinete do prefeito e a coordenadoria de Obras de Lupércio, mas ainda não obteve retorno.
A Coordenadoria Estadual de Defesa Civil diz esperar o relatório do IPT para estudar as medidas de contenção da voçoroca, em conjunto com o município.
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