Incêndios em SP: Ibama e governo estadual divergem sobre causa das queimadas

Governo federal diz que início simultâneo de focos de fogo reforça suspeita de ação orquestrada; gestão paulista afirma não ver elo entre ocorrências e atribui problema às condições climáticas adversas

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Foto do author Circe Bonatelli
Atualização:

BRASÍLIA E SÃO PAULO - O governo federal e o governo de São Paulo apontam suspeitas diferentes para a origem das queimadas que têm causado transtornos no interior de São Paulo desde o fim da semana passada. O Ministério do Meio Ambiente vê indícios de crime orquestrado. Já o governo estadual diz que prendeu três suspeitos e investiga crimes, mas afirma não ver sinais de ação organizada.

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As autoridades federais e estaduais afirmam que a temporada seca e os ventos fortes aumentaram o risco de fogo. O Ibama, por sua vez, afirma que o início dos focos de forma quase simultânea na sexta-feira, 23, é um indício de ação orquestrada.

Já a gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos) afirma que não há até agora elementos que conectem as ocorrências e acredita que o espalhamento rápido se deve às condições climáticas adversas.

Incêndios no interior paulista, como em Sertãozinho (foto), deixaram moradores em alerta. Foto: Divulgação/PRF

Além da Polícia Civil paulista, a Polícia Federal investiga possível ação criminosa. Segundo a Defesa Civil paulista, não há registro de focos de incêndio nesta segunda-feira, 26, mas há 48 municípios em alerta para novas ocorrências.

A estimativa é de que o prejuízo com as queimadas supere R$ 1 bilhão. Algumas cidades, como Ribeirão Preto e Brodowski, suspenderam aulas nesta segunda.

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Ao Estadão, o presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, afirmou que a grande maioria dos incêndios iniciados em São Paulo ocorrem em decorrência da ação humana

“A parte estranha é que, de fato, as ignições aconteceram quase todas no mesmo momento. Obviamente também estava quente, baixa umidade, ventando”, disse.

Por outro lado, segundo Agostinho, também chama a atenção a falta de raios nos últimos dias, o que resultaria em ignições espontâneas. “Cria uma desconfiança, mas tem de ser investigado.”

Ele também descarta participação de produtores de fazendas de cana-de-açúcar. “Acabou a queima da cana há muito tempo. E, em São Paulo, as usinas não têm mais essa prática. As usinas aproveitam a palha para gerar energia dentro da própria usina. Não faz sentido que elas tenham colocado fogo”, diz.

Na cidade de Dumont, um pátio da Policia Civil, que recolhe carros com alguma irregularidade, teve carros, caminhões e motos destruídos pelo fogo de sábado, 24 Foto: Celio Messias/ Estadao

O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos) afirmou que o Estado “não vai tolerar” delitos desse tipo, ao citar o caso de um detido em Batatais, que estava com um galão de gasolina e disse pertencer a uma facção. Tarcísio, porém, destaca não ver indícios de ação coordenada.

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“Não me parece (ação coordenada). Tem uma estiagem muito pesada, lavouras que estavam secas, calor extremo, baixa umidade relativa do ar e muito vento. Qualquer coisa pode provocar uma ignição”, afirmou ele, durante evento com empresários do setor imobiliário no Secovi-SP nesta segunda.

As três prisões por suspeita de incêndios propositais foram em São José do Rio Preto, Batatais e Porto Ferreira. Segundo o governador, há casos de fogo ateado de forma irregular, para limpar terrenos ou eliminar lixo, por exemplo. Um dos detidos, em São José do Rio Preto, é um idoso de 76 anos que incinerou lixo em uma área rural.

“Não me parece, a grosso modo, do que foi investigado até agora, que houvesse ação coordenada ou que eles estivessem conectados”, disse Tarcísio. Já outro dos presos, em Batatais, foi flagrado com um galão de gasolina e relatou pertencer a uma facção criminosa.

Incêndio na região de Sertãozinho, interior de São Paulo. Foto: CBM-SP

A expectativa é de que o depoimento dos três presos ajude a elucidar o caso. O Ibama tem auxiliado a Polícia Federal na perícia dos incêndios. O trabalho envolve a identificação de onde o fogo começou; se a queimada teve início em apenas um ponto ou vários; se há evidências de fogo acidental, como a presença de fiações em curto; entre outros pontos.

Estado já teve mais incêndios do que em todo o ano de 2023

O número de focos de incêndio registrados em São Paulo neste mês é o maior desde 1998. Até sexta-feira, quando houve o auge dos pontos de fogo, foram registradas 3.175 ocorrências, o dobro reportado em todo o ano passado, quando 1666 focos foram identificados.

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Está prevista uma reunião na Casa Civil, nesta segunda-feira, 26, para tratar sobre o tema. O governo articula ainda um encontro com a participação de governadores para abordar a questão. “Tem gente colocando fogo de maneira ilegal, uma vez que todos os Estados do País já estão avisados e proibiram uso de fogo de manejo”, escreveu o presidente no X.

‘Alerta total’ até outubro

A gestão Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem sofrido críticas por falhas no enfrentamento aos incêndios em série que ocorrem em vários biomas, como Amazônia e Pantanal. No domingo, Lula esteve na sede do Ibama, em Brasília, para debater operações de combate às queimadas. Em publicação na rede social X (antigo Twitter), Lula afirmou que o governo vai trabalhar com governadores para conter os incêndios.

Ao Estadão, o Agostinho, rebateu críticas feitas ao governo em relação à atuação no combate aos incêndios. Segundo ele, há 3 mil brigadistas em atuação em todo território nacional, considerando os efetivos do Ibama e do ICMBio, órgão federal responsável pelas unidades de conservação.

Agostinho destacou ainda a atuação de aeronaves do Ministério da Defesa nas operações, como o KC-390. Segundo ele, embora o número de brigadistas do Ibama seja menor em São Paulo, o grande contingente de bombeiros estaduais e a atuação de brigadistas das empresas de cana têm auxiliado no combate às chamas.

“Não é o governo que coloca fogo. Nosso papel é prevenir e combater . E isso está sendo feito, com esforço grande”, disse.

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O governo trabalha com a perspectiva de que o cenário continuará grave pelo menos mais dois meses. “A previsão é que a seca perdure até outubro. Mas como estamos vivendo sob mudanças climáticas, é muito difícil qualquer previsão. A grande esperança é que tenha episódios de chuva como em São Paulo e em uma parte do Pantanal, o que ajuda a amenizar o quadro”, acrescentou.

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