BRASÍLIA E SÃO PAULO - O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, decidiu atender a um pedido feito pelo deputado federal Alceu Moreira (MDB-RS), presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), e nomeou uma produtora rural para chefiar o Parque Nacional da Lagoa do Peixe, no Rio Grande do Sul, unidade de conservação que é administrada pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
Maira Santos de Souza, de 25 anos, é filha de fazendeiros conhecidos na região de Mostardas. Formada em Engenharia Agrônoma, ela trabalha na produção de arroz e soja na propriedade de sua família. Seu avô, Sidney Antônio Pereira de Souza, é grande produtor rural da região.
A indicação de seu nome foi confirmada ao Estado pelo próprio deputado. “Conversamos com o ministro. Esse parque desrespeitou a área dos produtores que moram lá há 200 anos e que não receberam indenização. Não tem plano de manejo. É uma perseguição completa”, disse Alceu Moreira. “Agora tem uma pessoa que é da região e que entende o que é necessário”.
Em seu currículo, obtido pelo Estado, Maira descreve como única experiência profissional seu trabalho na fazenda ASPS: "Acompanho todas as atividades da fazenda ao lado da minha família", como auxílio no preparo do solo, plantio e colheita da lavoura de arroz e soja e atividades de auxiliar de escritório. Não há nada no currículo que mostre que ela tenha conhecimento em conservação da natureza ou na gestão de um parque natural.
O Lagoa do Peixe é uma área única no País. Numa faixa estreita entre o oceano e a Lagoa dos Patos, tem em seus alagados pousio para aves migratórias e locais. Ali já foram catalogadas 275 espécies, como joão-grande, caraúna, tachã, maria-velha. Além dos imponentes cisnes de pescoço preto e flamingos.
O parque, porém, nunca teve a regularização fundiária concluída e ainda convive com alguns proprietários locais, que pressionam pela recategorização da unidade. Não é difícil ver cavalos pastando perto da lagoa.
O deputado afirmou que o objetivo é transformar o parque nacional (parna) em uma área de proteção ambiental (APA), uma categoria de conservação quase nada restritiva que, na prática, torna a região mais flexível para exploração comercial. A redução da área do parque também é requerida. “Temos agora alguém que a comunidade quer. Ela (Maria Santos) é uma pessoa que tem tradição lá, precisamos de uma pessoa que lidere.”
A nomeação foi publicada no Diário Oficial nesta sexta-feira, 12, pelo presidente do ICMBio, o coronel Homero de Giorge Cerqueira. A gestão do Parque Nacional da Lagoa do Peixe está cercada de polêmicas desde que Ricardo Salles participou de um encontro com produtores locais na unidade.
Em abril, o ministro mandou exonerar Fernando Weber, que chefiava o parque. O dirigente também era vinculado ao ICMBio. Questionado, na ocasião, sobre as razões que levaram à demissão de Weber, Salles disse apenas que “cargo de confiança é prerrogativa do Executivo escolher”.
Antes de demissão de Weber, o então presidente do ICMBio, Adalberto Eberhard, já havia pedido exoneração do cargo após o ministro determinar a abertura de um processo administrativo contra funcionários do ICMBio do Rio Grande do Sul. O anúncio de Salles foi feito na frente de Eberhard durante a visita do ministro à região.
Após ouvir queixas de pescadores e produtores locais sobre o ICMBio, o ministro pediu para que os funcionários do órgão se juntassem a ele na mesa. “Não tem nenhum funcionário?”, perguntou na sequência. “Vocês vejam a diferença de atitude: está aqui o presidente do ICMBio que, embora seja um ambientalista histórico, uma pessoa respeitada no setor, veio aqui ouvir a opinião de todos vocês. E na presença do ministro do Meio Ambiente e do presidente do ICMBio, não há nenhum funcionário aqui”, reclamou Salles.
Em seguida, o ministro anunciou a abertura de processo administrativo disciplinar contra todos os funcionários ausentes no evento. Eberhard manteve-se em silêncio. No dia 15, foi até seu gabinete em Brasília, limpou as gavetas, despediu-se dos funcionários e entregou a carta de demissão ao ministro.
Após sua saída, três diretores do ICMBio pediram exoneração. O comunicado foi apresentado à pasta pelo presidente-substituto do órgão, Régis Pinto de Lima, e pelos outros dois diretores Luiz Felipe de Luca e Gabriel Henrique Lui.
Servidores do Ibama que atuam em seis Estados e no Distrito Federal já enviaram representação ao Ministério Público Federal (DF) em que pedem que o órgão apure a conduta do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. Eles acusam o ministro de adotar práticas de "assédio moral coletivo". No Ibama e no ICMBio, funcionários afirmam que não podem mais se manifestar sem antes submeterem ao MMA. As áreas de comunicações dos dois órgãos foram desmontadas e centralizadas no ministério.
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