SÃO PAULO - “Vivemos um momento de dor e de desolação frente ao evento de Brumadinho. Não é caça às bruxas, mas se quisermos prevenir a repetição de eventos semelhantes, é preciso que o Ministério Público e o Judiciário possam ir até o fim. Se pararmos no meio do caminho, se a identificação das condutas não ficarem claras e os culpados não forem punidos, tudo recomeçará.”
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A opinião é do advogado Paulo Affonso Leme Machado, ex-promotor de Justiça do Estado de São Paulo, e um dos maiores especialistas em Direito Ambiental do Brasil. Ele falou ao Estado sobre os desafios e fragilidades da legislação ambiental brasileira em relação à mineração.
O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, vem defendendo uma reforma o processo de licenciamento. Ele diz que lei atual é 'complexa, irracional e não funciona' e sugere simplificar a legislação para os projetos de baixo impacto ambiental, o autolicenciamento e, assim, centrar esforços nas obras mais complexas. O que o senhor achar disso?
Uma questão que se questiona muito é o tempo de duração do processo. Concordo, é demorado. Tem de ter prazo mais estrito, se o profissional for alongando tem de ser responsabilizado, explicar por que está alongando. Mas dizer que é irracional, não é. Nem excessivamente complexo. Agora falar em casos mais simples… Eu sou contra essa diferenciação. Uma coisa que parece simples pode depois se mostrar complexa. Não vem escrito na testa do empreendedor ou do processo que seu impacto ambiental é mínimo. É preciso pesquisar para dizer qual será o impacto.
Veja imagens do rompimento de barragem de rejeitos da Vale em Brumadinho
1 / 37Veja imagens do rompimento de barragem de rejeitos da Vale em Brumadinho
Tragédia em Minas Gerais
A Agência Nacional de Mineração (ANM) declarou que a mineradora Vale vistoriou, em dezembro de 2018, estrutura da barragem de Brumadinho sem ter apont... Foto: Washington Alves/ReutersMais
Moradores
É comum ver imagens de moradores de Brumadinho olhando para o horizonte em silêncio Foto: Mauro Pimentel/AFP
Catástrofe ambiental e humana
Bombeiro recolhe gaiolas no meio do mar de lama da catástrofe de Brumadinho. Foto: Adriano Machado/Reuters
Animais
Equipes de resgate voluntáriastentaramsalvar a vaca que esta atolada na lama de rejeitos de ferro. O animal teve que ser sacrificado. Foto: Wilton Junior/Estadão
Dificuldade no resgate
Bombeiros têm dificuldade de acessar algumas áreas para fazer o resgate dos sobreviventes Foto: Douglas Magno/AFP
Tragédia em Minas Gerais
Uma barragem de rejeito se rompeu em Brumadinho, na região metropolitana de Belo Horizonte. Foto: Douglas Magno/AFP
Tragédia em Minas Gerais
Lama destruiu estrada em Brumadinho. Foto: Washington Alves/Reuters
Tragédia em Minas Gerais
A tragédia aconteceu na altura do km 50 da Rodovia MG-040. Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
Tragédia em Minas Gerais
As barragens pertencem à mineradora brasileira Vale. Foto: Washington Alves/Reuters
Catástrofe ambiental e humana
Bombeiros tentam, sem sucesso, resgatar uma vaca atolada após rompimento de barragem. Foto: Adriano Machado/Reuters
Tragédia em Minas Gerais
Segundo informações do site da Vale sobre as barragens da região, a estrutura que se rompeu foi construída em 1976. Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
Tragédia em Minas Gerais
A prefeitura de Brumadinho pediu que a população mantenha distância do leito do Rio Paraopeba, que é um afluente do São Francisco. Foto: Douglas Magno/AFP
Tragédia em Minas Gerais
A Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa), responsável pelo abastecimento de água na região metropolitana de Belo Horizonte, afirmou que não ... Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas GeraisMais
Tragédia em Minas Gerais
Segundo a Vale, a área administrativa, onde estavam os funcionários, foi atingida, assim como a comunidade da Vila Ferteco. Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
Tragédia em Minas Gerais
Os bombeiros enviaram equipes com policiais civis e militares, além de enfermeiros e medicamentos. Foto: Washington Alves/Reuters
Tragédia em Minas Gerais
Kombi foi soterrada pela lama após o rompimento da barragem em Brumadinho. Foto: Washington Alves/Reuters
Tragédia em Minas Gerais
Casa foi destruída e foi soterrada pela lama após o rompimento da barragem da Vale em Brumadinho. Foto: Washington Alves/Reuters
Tragédia em Minas Gerais
O governo federal montou um gabinete de crise em Brumadinho. Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
Tragédia em Minas Gerais
Moradores de Brumadinho observam a lama que atingiu a cidade. Foto: Washington Alves/Reuters
Tragédia em Minas Gerais
No município de Brumadinho vivem cerca de 40 mil pessoas. Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
Tragédia em Minas Gerais
O rompimento das barragens da Vale aconteceu na tarde de 25 de janeiro de 2019. Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais
Tragédia em Minas Gerais
O presidente Jair Bolsonaro fez pronunciamento no Palácio do Planalto, em Brasília, sobre a tragédia em Brumadinho. Foto: Ernesto Rodrigues/Estadão
Presidente Bolsonaro
Presidente Jair Bolsonaro observa destruição causada após rompimento de barragem da Vale em sobrevoo a Brumadinho Foto: Isac Nóbrega/Presidência da República
Tragédia em Minas Gerais
Voluntários trazem doações para as vítimas da tragédia em Brumadinho. Foto: Paulo Fonseca/EFE
Tragédia em Minas Gerais
Bombeiros retomaram os trabalhos na manhã deste sábado, 26. Foto: Corpo de Bombeiros de Minas Gerais
Tragédia em Minas Gerais
Fernando Nunes de Araujo é uma das dezenas de pessoas que começam a chegar na faculdade ASA de Brumadinho, onde deve ser divulgada a primeira lista de... Foto: Wilton Junior/EstadãoMais
Tragédia em Minas Gerais
Fernando Nunes de Araujo é uma das dezenas de pessoas que começam a chegar na faculdade ASA de Brumadinho, onde deve ser divulgada a primeira lista de... Foto: Wilton Junior/EstadãoMais
Batalha pela Vida
Bombeiros voltam enlameados após resgate em uma das áreas atingidas pelorompimento da barragem de rejeitos de Brumadinho, em Minas Gerais. Foto: Wilto...Mais
Estrada
Moradores observam trabalho dos bombeiros em estrada bloqueada pela lama em Brumadinho (MG) Foto: Wilton Junior/Estadão
Carro atolado
Um carro ficou atolado e destruído no meio da lama após o rompimento de barragem em Brumadinho (MG) Foto: Wilton Junior/Estadão
Helicoptero
Um helicóptero sobrevoa a cidade de Brumadinho, buscando vítimas após o rompimento da barragem Foto: Wilton Junior/Estadão
Bombeiros tentam encontrar sobreviventes em Brumadinho
Bombeiros tentam encontrar sobreviventes em Brumadinho após rompimento de barragem Foto: Washington Alves/Reuters
Corpo encontrado
Bombeiros carregam o corpo de uma das vítimas do rompimeto da barragem em Brumadinho até posto montado em frente da Igreja de Nossa Senhora das Dores Foto: Wilton Júnior/Estadão
Ponte
Ponte arrastada pela lama nas proximidades da barragem do Córrego do Feijão, em Brumadinho, MG, de propriedade da Vale Foto: Antonio Lacerta/EFE
Área devastada
Área devastada pela lama após o rompimento da barragem do Córrego do Feijão,de propriedade da mineradora Vale Foto: Wilton Júnior/Estadão
Equipe de resgate
Grupo de resgate caminha sobre a lama em busca de vítimas do rompimento da barragem do Córrego do Feijão, emBrumadinho (MG), de propriedade da Vale Foto: Antonio Lacerda/EFE
Resgate aéreo
Equipe de resgate usa helicóptero para procurar vítimas do rompimento da barragem do Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG), de propriedade da Vale Foto: Giazi Cavalcante/Código 19
Desde o desastre de Mariana, ambientalistas, cientistas e mesmo promotores da área de meio ambiente começaram a alertar para o risco de uma ‘fábrica de Marianas’ se o licenciamento fosse afrouxado. O sr. acredita que Brumadinho pode aumentar a pressão sobre esse debate?
Sim, acredito que deve aumentar a necessidade de um licenciamento ambiental mais forte, não mais fraco. A questão minerária, e principalmente mineral no estado de Minas Gerais, vem mostrando que o licenciamento tem sido muito frouxo e inclusive com domínio inegável negável dos mineradores. E o resultado é que as regras ficam afrouxadas.
O sr. vê falhas na legislação específica da mineração?
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Acho que há um grande erro, uma chaga, na Lei de Segurança de Barragens, que é o tanto de poder que dá ao empreendedor de se autofiscalizar. É ele que vai realizar as inspeções de segurança e elaborar as revisões periódicas de segurança. É uma lei defeituosa. São os mineradores que dão a última palavra no monitoramento. E você sabe que é muito difícil uma pessoa se auto acusar. Nossa segurança humana e ambiental fica à mercê ao arbítrio das empresas mineradoras e não do Estado.
O que é preciso para evitar que esses casos voltem a se repetir?
Por um lado, para que o licenciamento ambiental seja eficiente, é preciso que as pessoas que licenciam tenham independência funcional, de modo que elas não se submetam a pressões políticas e econômicas. Por outro, como cidadão e habitante deste planeta, eu espero que o Ministério Público e o Judiciário possam cumprir seu dever e ir até o fim. Se pararmos no meio do caminho, se a identificação das condutas não ficarem claras e os culpados não forem punidos, tudo isso recomeçará.
O sr. acredita que falta uma punição melhor para quem comete um crime ambiental no Brasil?
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Nós temos três vias (de punição) no Brasil: a administrativa, a civil e a penal. A administrativa pode multar, pode cassar licença, pode não licenciar – vai agir sob o império da lei 9.605 de 1998. A outra lei é a de responsabilidade civil, parte da Lei de Política Nacional de Meio Ambiente, que prevê responsabilidade civil mesmo sem culpa. Não precisa de intenção do empreendedor nem precisa provar sua culpa para ele ter de fazer, por exemplo, reparação do dano. Já no terreno penal, não se admite a responsabilidade objetiva, que é a civil. Vale a chamada responsabilidade subjetiva e precisa prova de dolo, direta ou eventual. A eventual é a mais fácil, que é agir na incerteza. O dolo eventual é aquele em que a pessoa deixou de tomar alguma providência, podendo fazê-lo. Temos todas essas frente a serem encaradas. A lei 9605 tinha de colocar em prática o que a Constituição brasileira instituiu que é aresponsabilidade penal da pessoa jurídica. Evidentemente não vai colocar a empresa na cadeia, mas pode colocar os dirigentes na cadeia. Esta lei estabelece, por exemplo, que se o empreendimento causar poluição em níveis que provoque dano à saúde humano ou morte de animais e destruição da flora, a punição é de 1 a 4 anos. Se ocorrer lançamento de resíduos sólidos, que é o caso, a reclusão pode ir de 1 a 5 anos. O mesmo pode ocorrer para quem deixar de adotar medidas de precaução em caso de risco de dano ambiental grave. Ou seja, tem uma previsão criminal. Essa lei também prevê penas à empresa, como multa, suspensão de atividade, interdição do estabelecimento, proibição de contratar com o poder público.
Mas por que, então, ninguém é preso por crime ambiental? Ninguém foi preso após o acidente de Mariana?