Em mais um sinal claro do processo de aquecimento global pelo qual está passado o planeta, o mês passado foi o setembro mais quente registrado no registro histórico, anunciou nesta quarta-feira, 7, o Serviço de Mudança Climática Copernicus, do Programa de Observação da Terra da União Europeia, que registra essa informação desde 1979.
Com base no observado nos primeiros nove meses do ano, a instituição estima que 2020 pode bater os recordes de temperatura e se tornar o mais quente já registrado, superando 2016.
A média global foi 0,05°C superior à observada em setembro do ano passado, até então o recorde de mais quente da série histórica para o mês. Este ano, a média para setembro superou ainda em 0,63ºC a média geral para o mês (registrada entre 1981 e 2010) e em 0,08ºC a média para o mesmo mês em 2016 – que, como um todo, foi o ano mais quente já registrado na história e teve o segundo setembro mais quente do registro.
Esse aumento na temperatura do ar foi registrado em diferentes pontos do planeta, como no norte da Sibéria, no Oriente Médio, em partes da América do Sul, Austrália e Europa. Nos Estados Unidos, Los Angeles chegou a registrar 49°C. Esse calor também foi observado no mês passado no Brasil, com vários dias de temperatura acima da média e quebras de recordes, que se mantiveram agora em outubro, culminando em um alerta de risco de morte emitido pelo Inmet nesta terça-feira.
A onda de calor que se espalha por todo o País nas últimas duas semanas tem sido particularmente forte no Centro-Oeste e no Estado de São Paulo. Esta terça-feira, 6, foi o 11° dia consecutivo em que o interior paulista registrou temperaturas acima de 40°C, em algumas cidades com sensação térmica de 45ºC, como em Barretos. De acordo com o Inmet, na terça a histórica onda de calor atingiu temperaturas de 44°C no norte do MS em Coxim e de 42,4°C no oeste de São Paulo, em Dracena.
Já o Ártico tem apresentado aquecimento desde a primavera do hemisfério norte, em um período que o relatório classifica como “incomum por sua magnitude e persistência”. Ainda em maio, a região apresentou temperaturas até 10°C mais elevadas que o normal, segundo o Copernicus. Em junho, bateu o recorde de 38°C, de acordo com a Organização Meteorológica Mundial (OMM).
O Copernicus também alertou que, em setembro deste ano, a cobertura glacial no mar ártico teve sua segunda menor extensão registrada desde o início da série histórica. “Em 2020, houve um declínio de rapidez incomum na cobertura de gelo durante junho e julho, na mesma região em que temperaturas acima da média foram registradas, pré-condicionando o mínimo de gelo marítimo a ser particularmente baixo este ano”, afirmou em nota à imprensa Carlo Buontempo, diretor do Copernicus.
É natural haver perda de gelo no Ártico nos meses de setembro (verão no Hemisfério Norte), quando a cobertura atinge o mínimo do ano, antes de se reconstruir e chegar ao nível máximo em março. Mas a perda é cada vez maior. “A combinação de temperaturas recorde e o baixo gelo marítimo no Ártico, em 2020, destacam a importância de melhorarmos e compreendermos mais o monitoramento em uma região que está aquecendo mais rápido que qualquer outro lugar no mundo”, disse Buontempo.
Estimativa para o ano
Cada mês de 2020 foi classificado até agora entre os quatro primeiros mais quentes do mês em questão. Janeiro foi 0,03°C mais quente do que qualquer janeiro anterior e maio foi 0,05°C mais quente do que qualquer maio anterior. Com o recorde de setembro, aumentam as expectativas de que este ano possa bater o recorde de 2016.
A comparação mês a mês, entre 1º de janeiro e 30 de setembro, das anomalias de temperatura (ou seja, quanto cada mês esteve acima ou abaixo da média) observadas em 2020 e 2016, aponta que o desempenho dos dois anos está bastante similar, de acordo com o Copernicus. Isso é um indicativo de que este ano pode acabar batendo o recorde de temperatura.
O relatório aponta, no entanto, que tudo vai depender da força do fenômeno La Niña, que teve início em setembro e se caracteriza pelo esfriamento das águas do Pacífico, pode ter alguma interferência nesse aquecimento. Por enquanto, ele ainda não conseguiu.
A temperatura média do planeta no período de 12 meses que vai de outubro de 2019 a setembro de 2020 ficou 1,28°C acima das temperaturas da era pré-industrial, aproximando o planeta do teto de aquecimento de 1,5°C, objetivo mais ambicioso do Acordo de Paris, que tenta limitar os impactos devastadores das mudanças climáticas.
O anúncio feito nesta quarta-feira reflete um ano de grandes incêndios em várias partes do mundo e da maior temporada de furacões ativos desde 2005, ao mesmo tempo em que o gelo no Oceano Ártico atingiu o segundo menor nível da história em setembro (verão no Hemisfério Norte). Especialistas preveem que em 2050 o Oceano Ártico poderá derreter completamente durante o verão.
Segundo a Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos (NOAA), há 99,9% de chance de 2020 entrar no ranking dos cinco anos mais quentes já registrados.
Mesmo com uma redução pontual das emissões dos gases que provocam o efeito estufa observada nos meses de lockdown por causa da pandemia de covid-19, a concentração de gás carbônio (CO2) na atmosfera permanece em elevação e continua aquecendo o planeta como um todo. O CO2 tem uma capacidade de ficar por centenas de anos na atmosfera, de modo que mesmo se as emissões zerassem hoje, o planeta ainda aqueceria por mais um tempo.
Mas em sua maioria, a comunidade científica defende que precisamos imediatamente conter essas emissões para tentar manter o aquecimento a menos de 2°C até o fim do século, a fim de evitar mudanças que possam ser dramáticas para a vida humana e de outras espécies.
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