Ao suspender os efeitos da Resolução 2.378/2024, do Conselho Federal de Medicina (CFM) – que veda a realização de “ato médico que ocasiona o feticídio”, nos casos previstos em lei, quando há probabilidade de sobrevida do feto com mais de 22 semanas –, o Supremo Tribunal Federal (STF) certamente não dimensionava a reação da Câmara dos Deputados, que ameaça, agora, aprovar um projeto de lei que equipara o aborto ao homicídio, impondo à vítima de estupro uma penalidade maior que a de seu agressor (PL 1904/2024).
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Trata-se de solução um tanto radical para um problema dificílimo.
Imensa parcela dos parlamentares, conectada ao sentimento majoritário da sociedade brasileira, discorda das recentes decisões do STF sobre o assunto, que incluem, ainda, a rejeição do Habeas Corpus em favor da liberdade de viver e contra o feticídio coletivo dos nascituros (HC 241721).
Como o direito à vida é inviolável, conforme a Constituição, e absoluto, porque não admite nenhuma relativização, urge imediata resposta por parte do Congresso Nacional – a qual deve ser ponderada para conciliar a proteção ao feto com o amparo a mulher e a efetiva distribuição de justiça.
Nunca é demais rememorar que a Constituição, também, proíbe a pena de morte – disposição que não pode ser modificada por emenda constitucional, já que trata de garantias individuais (vide a Carta Magna); nem, muito menos, por determinação exarada pelos ministros do Supremo.
Há um caminho do meio, entretanto, para a superação e pacificação do debate: uma alternativa equilibrada, que já está em curso, mas depende do apoio da população para avançar com celeridade – o projeto de lei 1249/2024, apresentado pelo deputado Cezinha de Madureira (PSD-SP) e subscrito por outros parlamentares. Eis um verdadeiro marco de defesa da vida, que contrapesa a salvaguarda do feto com a sensibilidade indispensável para isentar a mulher de punição.
O texto modifica dispositivos do Código Civil, do Código Penal e da Lei dos Crimes Hediondos para reconhecer o início da vida na concepção intrauterina, assegurando ao feto tanto a personalidade jurídica quanto a dignidade humana.
Diante disso, endurece a legislação, criando o tipo penal “homicídio por aborto”, hediondo, com penas severas para aqueles que realizam a prática – seja médico ou profissional de outra área, financiador ou quem tenha concorrido para o evento –, sem, todavia, criminalizar a mulher. Pelo contrário, ela passará a fazer jus a indenização contra os abortistas.
Ainda que passe a ser considerado crime hediondo, o aborto não acarretará consequências à mulher, dada a complexidade das situações que levam à ocorrência e a fundamental necessidade de auxílio à vítima, ao invés de penalização.
A mulher e seu núcleo familiar são deslocados da posição de agentes do aborto para sua real e verdadeira posição de vítima dos abortistas.
A proposição pune severamente todos que contribuem para o delito, levando à criação de uma rede de responsabilidade que enfrenta o problema com uma abordagem humana para com a mulher – e, ao mesmo tempo, rigorosa para com os responsáveis pelo aborto; afinal, são estes os verdadeiros aproveitadores, especialmente aqueles que auferem riquezas enormes a custo do sangue de inocentes e indefesos.
Temos que entender que a vida e a proteção a este direito instaura-se na concepção, se intensifica na medida em que a gestação avança – com as funções vitais do feto se consolidando até o ponto de estar em condições de nascimento com vida.
Enfim, o PL reconhece que o aborto é ato de morte, crime de sangue cometido contra inocentes e indefesos.
A aprovação do PL 1249/2024 é imprescindível, portanto, para consolidar um sistema jurídico que respeite a vida desde o primeiro estágio, assim como à dignidade feminina.
Logo, ao estabelecer a proteção do feto e reconhecer a mulher também como vítima, eximindo-a de punição por se submeter ao aborto; a proposta oferece um remédio ponderado, que resguarda a dignidade em todas as suas manifestações.
Nesse contexto, torna-se bem-aventurada a intervenção do Congresso Nacional em um tema tão grave e que, a despeito da discussão judicial, pertence, por princípio, legitimamente, à alçada do Poder Legislativo.
Enfrentar o feticídio não se restringe à prevenção do aborto: é preciso respeitar e proteger a mulher e, igualmente, o bebê.
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