Por que cruzeiros temáticos viraram febre? Veja como é por dentro um dos navios mais famosos

O ‘Estadão’ ficou três dias no navio de Wesley Safadão para entender como surgiu esse fenômeno; veja preços e datas das próximas atrações

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Foto do author Gabriela Piva
Atualização:

O navio do Wesley Safadão, o WS Onboard, saiu de Santos, no litoral de São Paulo, para a sua quarta edição entre os dias 12 e 15 de novembro. Com pacotes esgotados, o cruzeiro contou com Léo Santana, Matheus & Kauan, Zé Felipe no line-up do festival em alto mar, que virou uma febre entre a população de maior poder aquisitivo.

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Os dados da Associação Brasileira de Cruzeiros Marítimos (Clia) comprovam esse cenário. Segundo estudo, a temporada de 2022/2023 das embarcações será a mais longeva dos últimos 10 anos com quase seis meses de duração.

Importante para movimentar o mercado de turismo no País, só a temporada de cruzeiros de 2021 e 2022 injetou R$ 1,4 bilhão na economia brasileira. Os da Promoação, por exemplo, responsáveis por diversos navios temáticos, investem entre R$ 15 milhões e R$ 25 milhões na organização de cada evento.

As embarcações da MSC Cruzeiros, que abrigam shows como os de Luan Santana e do cantor Daniel nesta temporada, prometem uma rota de três dias saindo de Santos, no litoral de São Paulo. Porém, nem sempre o roteiro é definido com antecedência.

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O cruzeiro de Wesley Safadão, por exemplo, pretendia passar por Angra dos Reis e terminar o trajeto em Búzios antes de retornar para Santos. Porém, não foi possível seguir o trajeto previsto.

Essa é a maior diferença entre navios comuns e temáticos. O comandante, Rafaelle Accarino, do Ws Onboard, conta ao Estadão que alterou a rota mais de 100 vezes para evitar uma tempestade - por isso, as duas paradas foram em Angra dos Reis.

“Em um navio comum, as pessoas ficariam na área interna e nós seguiríamos a rota [previamente traçada]. Aqui, os passageiros ficam lá em cima [área externa, onde ocorrem as festas]”, explicou ele sobre o motivo pelo qual altera o trajeto em festivais flutuantes.

Conforme um funcionário anônimo da MSC, não há grandes diferenças entre um navio comum e um festivo para os empregados. A maior delas diz respeito às classes sociais de cada público. “No comum, são passageiros da classe média; nos festivais, classe média alta para elite”, comenta.

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Léo Santana destaca a experiência "diferenciada" em shows nos cruzeiros temáticos Foto: Igor do Ó/ Giro Criativo

Visibilidade para artistas

Um dos beneficiados nesse negócio são os artistas. Segundo Joca Ribeiro, sócio da Promoação, muitos deles querem um festival em alto mar com o próprio nome - mas nem sempre isso é possível.

Ele e os outros sócios da empresa, Eduardo Cristóvão e Bruno Ribeiro, costumam negar propostas para evitar embates entre cantores com um público similar.

Léo Santana, por exemplo, não dá nome ao navio, mas participa do line-up do Ws Onboard. Com mais de 4,2 milhões de ouvintes mensais, grande parte do público dizia estar ansiosa para assistí-lo.

Ao Estadão, ele diz que participar de um evento “diferenciado” como esse traz visibilidade para sua carreira. Para o cantor, a presença da imprensa no cruzeiro mostra como o fenômeno desperta curiosidade. Esse, porém, não seria o motivo principal para aceitar o convite pela terceira vez.

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“É uma experiência surreal e muito diferente de estar na estrada. Quando termina o show, não dá para ir para outra cidade [como normalmente acontece em turnês]. Tem que ficar aqui e esperar”, contou, aos risos.

Chilli MOB Cruise ocorre desde 2012, sendo que sua próxima edição está marcada para o final de março de 2023 Foto: Alisson Demetrio

Música, arte e moda

Caíto Maia, CEO e fundador da Chilli Beans e criador do Chilli MOB Cruise, cuja saída está marcada para 31 de março de 2023, organiza o navio Costa Favolosa com seis meses de antecedência.

Com um investimento de R$ 7 milhões por embarcação, o maior desafio é proporcionar uma boa experiência para cerca de 3,8 mil passageiros. Para isso, Caíto obedece os pilares da marca de óculos: moda, música e arte.

O impacto da experiência é percebida no dia a dia da empresa. O empresário contou ao Estadão que a permanência dos funcionários na Chilli Beans aumentou desde a estreia do cruzeiro, em 2012.

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A próxima edição já está com tudo pronto, garantiu ele. “Teremos a tribo indígena Yawanawá com a gente no navio”, revela.

A ideia de convidar a tribo para participar do cruzeiro surgiu por Caíto valorizar a cultura brasileira. A paixão dele pode ser vista em uma das próximas coleções de óculos da Chilli Beans, chamada Raízes do Brasil, que homenageia os povos originários.

O line-up musical fica sob responsabilidade da MOB, com quem a Chilli Beans faz sociedade. Na edição de 2023, Priscilla Alcântara, Pedro Sampaio, Jet Leg são algumas das atrações musicais confirmadas.

'Dançando A Bordo', da Costa Cruzeiros, está em sua 18ª edição e é um dos navios mais bem-sucedidos da empresa Foto: Filippo Vinardi

Sete noites de viagem e dança

A Chilli MOB Cruise freta uma embarcação da Costa Cruzeiros, o Costa Favolosa, que também possui um navio temático próprio: o Dançando a Bordo.

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Na 18ª edição, a saída do cruzeiro está marcada para Santos, em São Paulo, no dia 12 de março, por sete noites. Diferente dos outros, a rota é definida e tem paradas em Ilhéus e em Salvador, na Bahia.

Sem abrir os números do investimento em cada edição, Ruy Ribeiro, diretor comercial da Costa Cruzeiros, diz que o Dançando A Bordo é o que tem maior taxa de repetição da companhia. Isso significa que os passageiros compram as cabines da próxima edição assim que finalizam uma viagem com a empresa.

Com o coreógrafo e dançarino Carlinhos de Jesus, conhecido por filmes como Dançando Lambada e Ópera do Malandro, a embarcação temática conta com diversas aulas de dança, como tango, salsa, bolero, valsa.

Dançando A Bordo, da Costa Cruzeiros, está na sua 18ª edição  Foto: Divulgação/Costa Cruzeiros

Por que virou uma febre?

O sucesso dos cruzeiros temáticos, na opinião de Ruy Ribeiro, surge da união entre o gosto pelo evento e o conforto do navio. Para isso, os empresários afirmam ser de suma importância a escolha das embarcações. Com o objetivo de selecionar a melhor opção, Eduardo Cristóvão vai até a Itália, sede da MSC Cruzeiros, para trazer os barcos ao Brasil - o trajeto dura cerca de 18 dias.

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Dos 16 depoimentos que o Estadão ouviu no Ws Onboard, muitos deram uma justificativa similar a de Ruy sobre o motivo pelo qual escolheram pagar por um cruzeiro temático em vez de um comum. Eles disseram que, nessa opção, desfrutam de suas atrações favoritas e do conforto local simultaneamente.

O navio MSC Fantasia, com capacidade para 4,3 mil hóspedes, por exemplo, possui diversos lounges, piscina aberta e aquecida, cassino, teatro, restaurantes e bares espalhados pelos 18 andares do navio.

Entre os passageiros do Ws Onboard, estavam os moradores do Ceará, a empresária Deisiane Araújo e o marido, Rogerio Vasconcellos, que gostam tanto de navios temáticos a ponto de viajarem duas vezes no de Wesley Safadão.

Donos de uma empresa, também encontraram uma oportunidade de fechar contratos publicitários no navio. Com uma lista extensa de convidados, como a ex-BBB Natália Deodato, o influencer Tokinho, Daniel Caon, o casal conseguiu parcerias com alguns influenciadores durante o festival.

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O professor Emerson Ferreira, de Rio Branco, no Acre, embarcou com quatro amigos no Ws Onboard. “Não tem muito o que fazer na capital acriana. Então, é comum os cidadãos juntarem dinheiro para viajar”, contou.

Mesmo satisfeitos, nem tudo são flores nas experiências dos cruzeiros. A família de Fernando Luiz, empresário do ramo de navios de carga do Rio de Janeiro, reclamou da limpeza na área externa da embarcação. Segundo ele, as pessoas ficaram “tão loucas” no final da primeira noite que urinaram no chão e no carpete.

Rosilene Pereira, prima da esposa de Fernando, disse que a falta de banheiros na área externa também causou a situação. “O pessoal sai do show e quer ir ao banheiro, ninguém vai pensar em descer duas escadas para poder usar o do outro andar”, opinou ela.

Rosileide de Almeida e o marido, Fernando Luiz, aproveitaram a última noite do 'Ws Onboard', que teve show de Bell Marques Foto: Igor do Ó

Regras? Que regras?

Descumprimento de regras parecia ser algo corriqueiro no Ws Onboard. Em um manual dos passageiros, estava explícito que caixas de som com volume alto eram proibidos no navio. Porém, as pessoas não só levaram seus aparelhos, como colocaram som alto em diversas áreas - em restaurantes, nos elevadores, nas escadas.

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O Estadão observou que os funcionários não costumavam se pronunciar nessas situações. Alguns passageiros acreditavam que eles se silenciavam por não saber português. Segundo o profissional anônimo, é obrigatório que 30% da tripulação seja brasileira quando o cruzeiro navega pelo País.

O assédio sexual também foi um problema. O Estadão presenciou uma situação no camarote na qual um senhor casado com uma mulher tentou, sem consentimento, beijar o pescoço de um homem - e enquanto a esposa estava de costas para os dois.


Wesley Safadão durante show no 'Ws Onboard', que ocorreu entre os dias 12 e 15 de novembro de 2022 Foto: Igor do Ó/ Giro Criativo

Débora Monteiro, que viajou pela primeira vez em um cruzeiro, não fora vítima de assédio sexual. “Pensei que seria pior. Ouvi falar em assédios maiores com gente chegando, beijando, puxando, porém, não vi e não vivi isso. Ouvi alguns elogios, sorrisos, mas nada abusivo ou invasivo”, disse.

Segundo outro funcionário anônimo do navio, as regras do local são exigentes com relação a crimes. Caso alguém se sinta coagido, seja psicológica ou fisicamente, pode reportar o incidente ao MSC Fantasia e, se comprovado, o acusado será desembarcado em um dos portos.