Nesta parte do Pará, o litoral não é dono de belezas óbvias. A faixa de areia até a água é extensa, com partes fofas no início, que se transformam em metros lisos, planos e com espaçadas lagoinhas formadas pelas vazantes. Turva, a água da Bacia do Marajó oscila aos olhos entre um verde escuro e marrom e não parece convidativa ao banho. Ainda mais sabendo que nela não é difícil se deparar com arraias, motivo pelo qual poucos arriscam ir além da água no umbigo. Se for, entre arrastando os pés na areia para evitar pisar em uma delas e levar uma ferroada.
A ventania de meados de setembro não dava trégua. E quando digo ventania, é ventania de verdade, daquelas de levar a farofa do prato para Iemanjá. Mas nada que atrapalhasse a alegria de relaxar sobre uma rede colorida, aberta na sombra de quiosques de palha ou árvores, sentindo todo o sossego do Marajó.
Pesqueiro
Salvo por uns três casais, uma família fluminense, uma dezena de cachorros e um búfalo de passeio, tínhamos toda a Praia do Pesqueiro ao nosso bel-prazer. Sem sinal de celular e com uma dezena de redes ao nosso dispor, estávamos completamente desconectados, ouvindo somente o vento, que esculpia as dunas da praia e balançava sua sequência de coqueiros.
Aproveitamos para colocar a leitura em dia, tomar sol, acompanhar gaivotas e gambás à espera de um peixe dando sopa. Por falar em comida, almoçamos nas barracas de praia pirarucu frito, acompanhado de salada, arroz, feijão e farofa, servidos em graciosos potes de cerâmica (R$ 60, para dois).
A 10 quilômetros do centro de Soure, a praia é acessível de carro – com fôlego, considere a bike. Se for de táxi, lembre de combinar com o motorista a hora do retorno, já que não há sinal de celular.
Na ida ou na volta, pare na Granja Mironga, onde é possível comprar o famoso Queijo do Marajó, tipo fresco cuja técnica existe há mais de 200 anos na região e, há quase 100 anos, tem como principal ingrediente leite de búfala.
A porteira fica aberta e logo se avista uma espécie de quiosque com a placa “pague e leve”. Não há atendente nem maquininha de cartão. Um pote de plástico indica que ali é o local onde se deixa o pagamento – ou seja, leve dinheiro trocado. Ao lado, fica a geladeira com os queijos (250 gramas, R$ 12,50) e também manteiga e doce de leite (R$ 12 cada).
Barra Velha
Júnior sentou na mesa de madeira de um dos quiosques de teto de palha, cumprimentou os conhecidos e pediu duas águas de coco, uma delas para mim. Ali, ele parecia em casa. E de fato estava: “Essa é a praia que o pessoal daqui vem no fim de semana”.
A apenas 3 quilômetros do centro de Soure, Barra Velha tem algo valioso: o manguezal. Ao longo da faixa de areia, cuja extensão depende da hora e do escoamento da água da baía, galhos retorcidos dançam e se entrelaçam, ora isolados, ora compondo uma passarela.
Sem coragem para entrar na água com chance de arraias, imitei duas garotas que lá estavam: estirei meu corpo em uma das lagoas formadas pela maré. Pais e filhos também vão gostar dali: boa visão e liberdade para brincadeiras.
Joanes
Ainda mais desértica estava a Praia de Joanes, em Salvaterra: éramos nós e mais dois casais, além do nosso taxista Ismael e da funcionária da Peixaria do Sales, um dos restaurantes mais recomendados desse lado da ilha. “Mas na alta temporada, depois do Círio de Nazaré, por exemplo, aqui enche de turista”, garante.
O ambiente é simples, e o restaurante estende duas redes na sombra das árvores, de frente para a praia de rio, e serve a refeição ali. Fomos de clássico: filé de búfalo a cavalo com arroz, feijão, macarrão, batata e farofa (R$ 70 para dois).
Das três praias, Joanes é a que menos encanta. Mas, para quem gosta de história, ela fica mais interessante como parte de um roteiro pelas ruínas da antiga Vila de Salvaterra, onde resiste ao tempo a parede de uma igreja jesuítica do século 18. Dali, a vista para a Baía do Marajó em direção ao Oceano Atlântico é digna de cartão-postal.
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