O dia quando amanheceu trouxe finalmente a paisagem. Ela, a paisagem, feita de verdíssimos morros tropicais que mergulham decididos no mar de águas entre cinza-claro e azul-cintilante – depende da hora – é a grande protagonista de todo dia em Seychelles.
O arquipélago de 115 ilhas no Oceano Índico volta e meia está em evidência por causa de alguma celebridade do calibre de Kate Middleton e príncipe William, ou série de TV com a audiência da falecida Lost. E, em linhas gerais, é isso: uma luxúria sensorial cujo mérito é da natureza. Com retoques e acabamentos arrematados por cadeias hoteleiras internacionais que instalam ali seus resorts sem modéstia e sob as bênçãos do governo, já que 30% dos empregos e 70% do faturamento em moeda forte, euro e dólar, vêm do turismo.
Pois aquele dia que acabava de nascer revelou o que escondera a escuridão semisselvagem da noite anterior, quando pousei no aeroporto internacional na ilha de Mahé, a maior e principal. Uma natureza formada por palmeiras, bananeiras, caneleiras e arbustos de abacaxis em pequenas e densas florestas. Estradas de mão dupla equilibradas à beira das encostas de pedras e areia de praia, nas quais se dirige pelo lado esquerdo, o da mão inglesa. E o mar, claro, que é o motivo número um pelo qual se vai a Seychelles.
Seria errado falar em primeiros raios de sol. Era por eles que eu esperava quando deixei abertas as cortinas black-out do meu imenso quarto do resort Four Seasons, onde passei três noites. Não vieram. O hotel, espalhado pela encosta e quase sufocado pela vegetação, mira o oeste – o continente africano, se melhorar a referência. Ali é o ponto onde o sol se põe.
Conservação. Não houve espetáculo do nascer do sol, mas o dia foi deslumbrante do início ao fim. As cortinas abertas ao menos serviram para me despertar bem cedo, e com ótimo propósito: uma sessão de snorkeling guiado logo às 8 horas. Quando cheguei à praia do resort, muitos metros abaixo da minha varanda, o mar já era escandalosamente azul. Foi diante dele que Tania Militello, integrante do projeto de conservação marítima Wise Ocean, que atua em Seychelles em parceria com o governo local, explicou o processo de recuperação dos corais moribundos que sua equipe encontra no fundo do mar bem ali, diante da praia do Four Seasons, na baía de Petit Anse.
A baía está ao sul e na costa oposta à de Victoria, a capital e principal cidade, onde vivem 26 mil dos 92 mil habitantes do país. Os 490 quilômetros de costa incluem as demais ilhas – Praslin e La Digue são as outras que recebem turistas com regularidade – de forma que duas horas são suficientes para dar a volta completa a Mahé de carro.
Com esforçada delicadeza, prendi o pedaço de coral que parecia um picles em conserva a uma barrinha de ferro. Depois de um estágio numa espécie de enfermaria, o pobrezinho volta às águas e, com sorte, recupera a vivacidade e a autonomia.
A educadora Charlotte Orba distribuiu máscaras e nadadeiras e iniciamos a incursão mar adentro sem nunca perder os pés de vista. Com eles, os pés, é preciso cuidado: pisar com convicção pode significar uma topada ou corte num pedaço de coral. Melhor flutuar de vez.
Os varais submersos onde ficam presos os corais em recuperação – para que não sejam levados pela correnteza – ficam por ali. Peixes de cores e formatos variados desfilam diante dos olhos. O corpo listrado e máscara preta do angelfish imperador. O papo esverdeado do peixe-papagaio. A boquinha azul do oriental sweetlips. Mais de mil espécies de peixes nadam entre corais ao redor das ilhas de Seychelles. Há também tartarugas. Charlotte, a guia, esperava encontrar ao menos uma ao dobrar a esquina de uma rocha bem grande, na ponta da colina que limita ao sul a baía de Petit Anse. Apesar da ansiedade, não foi nosso dia de sorte no quesito tartarugas. Mas só nele.
Porque ao sair da água, um farto café da manhã estava a postos no restaurante Zez, com vista, obviamente, para o mar. Com tempo suficiente para provar o suco do dia, à base de abacaxi, escolher ovos, waffles e panquecas, e atacar o bufê multinacional com charutos de folhas de uva, guiozas, quiches, homus, linguiças, queijos, croissants, frutas e pães, tudo junto e misturado.
Ainda era apenas 10 horas da manhã. O começo irretocável de um dia que, até o fim, foi de relax e autoindulgência.
Três respostas
REMO, SPA E IOGA EM UM DIA INTEIRO PARA RELAXAR
Deu vontade de cochilar nas camas acolchoadas na areia da praia depois do café da manhã com tamanho de brunch. Era esse o plano até a hora do próximo compromisso, o horário agendado no spa do Four Seasons. Mas o instrutor e as pranchas de stand up paddle estavam logo ali, convidando à ação, mesmo com o corpo pedindo preguiça.
Para a iniciante que eu era, foi um alívio perceber que, com pelo menos 70 centímetros de largura e cerca de 3 metros de comprimento, a prancha só tomba se você quiser muito cair. Por ser grandona, é de uma estabilidade tranquilizadora.
Assim, escutei as instruções e, minutos depois, estava de pé e remando. Apesar dos esbarrões e de alguma dificuldade para coordenar ouvido e movimento (uma remada à esquerda, outra à direita, e vice-versa), ao fim de meia hora eu me sentia uma remadora de fato.
É na água que está grande parte da diversão em Seychelles. Das aulas de stand up paddle e surfe ministradas pela Tropicsurf, baseada no Four Seasons (tropicsurf.net; desde 40 euros cada aula) às sessões de mergulho do Underwater Centre, cuja base é o resort Berjaya Beau Vallon (diveseychelles.com.sc; desde 40 euros cada descida). Iates e barcos de pesca para excursões em grupo ou fretamentos exclusivos somam pelo menos duas dúzias, listadas no site oficial de turismo do país, e com contatos disponíveis na recepção dos hotéis.
Como na China. Foi um tratamento conceitual, o do spa do Four Seasons, no ponto mais alto do hotel, com vista deslumbrante. Os cosméticos são da marca local Yi-King, que se baseiam nos oito elementos mestres reconhecidos pela medicina chinesa. São os mesmos usados em outros sete resorts de Seychelles, entre eles Constance (em Praslin), Denis (em uma ilha privada) e Kempinski, na vizinha Baía Lazare.
A data de nascimento do hóspede determina o elemento mestre e esse, o tipo de massagem. Meu elemento, lago, indicava tensão no pescoço e nos ombros, sinal de alguém sempre apressado. A massagista balinesa Yuni era forte como não imaginei ao ver sua estatura mignon. Tive de pedir para diminuir a pressão – mas, ao sair de lá, a sensação era de flutuar.
De volta ao quarto, me esperava o almoço harmonizado com o tratamento: camarões com molho agridoce, cuscuz e grão-de-bico acompanhados de um copo de vitamina de grão-de-bico com xarope de avelã.
O perfeito dia de relaxamento terminou no alto de um morro, com vista para Petit Anse, depois de meia hora de trilha na mata, durante a qual se via também a Baía Lazare. Diante do pôr do sol, participei de uma sessão de “ioga do riso”, nome que o mestre deu às brincadeiras quase infantis que, sim, foram ótimas para gargalhar de alegria e tranquilidade.
COMO CHEGAR A SEYCHELLES
Como chegar: de São Paulo a Mahé, ida e volta, desde R$ 4.961 na South African; R$ 6.390 na Etihad (que opera em code share com Air Seychelles); e R$ 9.731 na Emirates.
Visto: não é necessário. São exigidos passaporte válido, comprovante de hospedagem e passagem de volta.
Moeda: R$ 1 vale cerca de 4 rúpias de Seychelles.
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